PROSA NESCAFÉ
Acorda, Muguerço
Que o Sol já está se pondo
Enquanto a Nega-Loura
Me olha com ternura.
Não é somente pelo vento que venta veloz,
Ou pela música cujo videoclipe eu adoro.
É porque às vezes
– às vezes bem às vezes mesmo –
Dá vontade de contar ao mundo, as coisas que acontecem comigo.
O que é que essa Nega-Loura faz aí tão escondidinha?
Osso, madeira, borracha e pano.
Tudo quanto é comestível,
Dissolve-se ferozmente na baba do cãozinho travesso.
– Ah, Nega-Loura, qualquer dia ainda te beijo a boca!
Às vezes me pego pensando...
Por que cargas d’água,
O pai do Raulzito não o dava o bendito sapato trinta e sete?
Será que naquela época, o preço era por numeração?
– Não meu senhor, gasta mais couro, mais borracha, mais cola. Por essa quantia só posso vender-lhe um trinta e seis.
E então nascia uma famosa música...
Ahhh, e aquele grito de “Hey Pumba!” preso na garganta
Dá uma saudade do Meu Bem!
Ô Benzinho, não me ignore não...
Eu juro que foi sem querer.
Procurei-te e soube que saíste com seu amigo poeta.
Pois volte logo e ligue pra mim.
Mas o foda de tudo é essa bala de gengibre
Que arde forte na língua
E faz até lagriminha sair do olho,
Nem sei por que resolvi chupar.
Enquanto isso,
A Nega-Loura observa atentamente
O aprisionar da abelha
Que pousou na mesa enquanto eu escrevia.
Estaria ela – a Nega-Loura nããão, a abelha –
Forjando um possível ataque contra a minha pessoa?
Ah, não paguei pra ver, não...
Sabe Muguerço, até que talvez eu agüentasse a distância,
Se a medida não passasse dos centímetros...
Ficar longe de você não é mole não!
Achei melhor soltar a abelha.
Se quiser, que me ferroe,
Agora, pelo menos tem motivo.
Se bem que... ela deve admitir, fui piedosa
Que seja ela, piedosa comigo também.
E lá se vai suntuosamente a Nega-Loura
Com seu pedaço de pau na boca,
Rebolando sem parar...
A abelha???
Parece que leu o que escrevi.