Auge

Lembro de você no auge, jogando esmola aos mendigos, esnobando as pessoas. Era só uma pequena estrela decadente. Você brilhou em altos salões de classe, empunhou taças de vermute e dry gin com total naturalidade e sorria com vigor exibindo saúde pelos cantos limpos de sua boca. No auge.

Você deslizava quase imóvel pelas ruas limpas e nobres do seu quarteirão, e ninguém ousava lhe perguntar alguma coisa ou sequer interromper sua respiração. Naqueles tempos em que você era como uma princesa...

Isso foi no seu auge, mas agora que seu trono desabou, a poeira cobre seu rosto e tinge seu sorriso de marfim. Você não atira mais moedas aos vagabundos porque está junto deles, rasgando seu vestido para tapar seus ferimentos. Seu andar é lento e desastroso, e enquanto suas pernas se confundem na sarjeta, você é esquecida por todos e quem passa não te enxerga, pois seu vulto é só uma mancha de sujeira.

Agora você tenta fazer acordos durante a madrugada pelos becos escuros, confia sua sorte nos vagabundos e espera deles uma misericórdia. Você traga solidão e bebe imagens familiares, tenta encontrar na mente alguma conexão com a realidade, mas tudo o que você tem são trocados, e nenhuma passagem de volta para o passado. Você vai apodrecendo e deixando de sonhar nas ruas, vai sofrendo e esperando as pessoas passarem e lhe atirarem algumas moedas.

E você as vezes sonha, durante a noite, com o tempo em que você estava no auge... mas agora, deitada na calçada, você olha debaixo para as pessoas e acha tão perigoso estar no auge. Então vai esquecendo das conexões com o passado e seu olhar se torna apenas um vácuo no espaço, sem glória, sem esperança. Você está invisivel agora, sem o que ganhar e sem o que perder. Assim como você estava no auge...

Reny Moriarty
Enviado por Reny Moriarty em 14/03/2011
Código do texto: T2847713
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