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NOTA 1: Essa prosa poética é uma narrativa ficcional, inspirada em muitos relatos que se ouviam em um período muito conturbado da vida do país, no final da década de sessenta. O personagem central e todos os elementos da narrativa são fictícios. Os versos entre parênteses foram extraídos de músicas do Compositor Lupicínio Rodrigues, muito populares na época, e foram inseridos por se integrarem harmoniosamente ao texto de ficção.

Nota 2: Um texto literário deve ser lido e compreendido tendo-se em conta que este pode ser fictício ou acontecimento de terceira pessoa, narrado na primeira, ou ainda pura abstração. Nem sempre é biográfico.

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Aquele, de terno marrom,

(atente na camisa amarela,

Manchada de café)

Com a cara bexigosa,

Rubicunda, torta.

Lábios adelgaçados,

Nariz de cavalete,

É capitão ou tenente,

Não sei bem.

Não veio de “escola”,

(Percebe-se pelos modos).

Deve ser “de carreira”:

Soldado, cabo, sargento,

Ou do baixo oficialato.

Na reforma deve chegar

A major, se tanto.

E a hora já chega,

Talvez já passe dos cinqüenta.

Mas posso estar enganado

(Essa gente nos confunde),

Talvez seja um civil, infiltrado.

Advogado, engenheiro, dentista,

Médico ou contador, quem sabe?

Diretor de grande empresa,

Funcionário de autarquia,

Ou profissional liberal.

Tudo nele é enigmático.

Mas a corrente...

Esta, ele sempre carrega.

Pode-se adivinhar o volume

Inchando sua pasta preta

(de nylon ordinário),

Metálica, fria, pesada,

Pronta para afligir,

Conduzida por suas mãos

Rudes, vestidas de fino couro.

E como ele a usava.

Cinco, seis vezes por dia,

O aço cumpria o flagelo

Marcando, dilacerando,

Sangrando, mortificando,

Ao som de berros agoniados.

Corpos sãos, cultos,

Eram massas disformes,

Caídos, mudos, mortos.

E que alegria brilhava

Nos olhos cavos do algoz

(azuis, frios, baços).

Por vezes assoviava,

E era sempre Lupicínio

(Mas, enquanto houver

Força em meu peito,

Eu não quero mais nada.

Só vingança, vingança ...)

Outras vezes solfejava

– Ainda o gaúcho –

(E depois encontrar esse amor,

Meu senhor,

Ao lado de um tipo qualquer)

Pespegando as pancadas,

Ritmando-as, cuidadoso

(Eu só sei é que quando a vejo

Me dá um desejo de morte ou de dor)

Vez por outra duvidava-se

Da pequena gota salgada

Que do azul baço descia, lenta.

Nos porões, falava-se

Que aos domingos, comungava,

Ajoelhado, sereno, contrito,

Enquanto uma das mãos, no bolso

Do indefectível paletó marrom,

Acarinhava os elos da sua amiga.

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Luiz Vila Flor
Enviado por Luiz Vila Flor em 12/03/2011
Código do texto: T2843025