[O Óleo Quente do Ódio]
Um vero derrame...
O quente óleo do ódio
escorre, banha o meu fígado;
o fel enche-me a boca...
Mais uma morte? É sim!
Não há estranhar nisto;
em algum ponto do corpo há de arrebentar:
é com o meu fígado que eu reajo
aos ataques, aos males do mundo;
e quase sempre, ou sempre,
eu não me saio bem das refregas!
Mas sou como o boi carreiro,
junto forças, descarrego a minha fúria
no esforço para vencer a subida!
Se lamurio é por que o óleo quente do ódio
que cozinha mal cozido o meu fígado,
me põe nessa gemedeira, nessa dor...
Descomparação: na saída da passagem do córrego,
a extensa subida, o sofrimento dos bois...
Para anunciar o quanto dói esse esforço,
o carreiro apanha o chifre de banha
quente do sol abrasador do sertão,
e derrama nos cocões do carro;
aí sim, que a gemedeira da subida se alonga,
espalha-se pelos campos, pelas grotas -,
a dor aperta no aboio que a lembrança entoa...
O carreiro, a banha quente do sol,
o óleo quente do ódio em meu fígado,
o carro gemendo na subida,
eu, de bom ódio, chorando na vida...
Desconjuminações, deslembranças,
eu e os meus desaconteceres
ficamos perdidos pela aí...
Quem achar, perdeu... ou vai perder!
[Penas do Desterro, 07 de março de 2011]