O COLIBRI COLHE BRISA.

Um dia eu vi um colibri que dizia pro outro: “colhe-brisa”! O Senhor TEMPO que estava por perto retrucou: “colhe eu”. Como o colibri não lhe deu ouvidos, colheu apenas a brisa. Mas o tempo lhe colheu. De repente o grilo não acreditando no SUMIÇO do seu amigo, gritou pro tempo: “assassino”, por que levou meu amigo colibri? Não fui eu quem o levou, argumentou o tempo. Perguntado pelo tempo se creu na  inocência do colibri, o grilo ficou quietinho respondendo baixinho ao tempo: “cri”, “cri”, “cri”.

No meio dessa conversa desafinada, um sapinho serelepe logo se insurgiu contra o tempo. Ah, Senhor tempo, dizem que foi o senhor que me fez com a boca grande. Não. Eu apenas pedi ao Criador pra te fazer com os olhos grandes, pois é pelos olhos que a alma se estabelece. Então, Senhor Tempo, meus olhos são sinais de coisa boa? Se boa eu não sei, mas deixo-te a pensar: “tens os olhos grandes, mas nunca sais da lama”. “Tens a boca grande, mas só engoles cobras”... Dizem que eu, O TEMPO, sou o grande transformador da terra. Contudo, ninguém me toca. Minha toca é na esquina do mundo, onde o limite do mundo deixa de ter limites porque os homens preferem se iludir no ideal do eterno.

Eu sou o tempo que passa o ferro no rosto do povo. O silicone se instala de novo. Eu passo o bisturi nas faces das madames, quem quiser que se engane; quem quiser que se engane.  Mas sem enganação, eu sou o TEMPO presente. Indefinível e indecifrável pra muitos, mas real, na medida em que sou fictício.

Sou O TEMPO. Você pode me definir como uma rede de balanço sem ninguém dentro dela. Como um mosteiro abandonado no meio da floresta. Como um colar de rubi sem pescoço para ostentar-se. Como uma cadeira da vovó sem vovó. Como uma aliança de brilhante sem dedos. Como batom sem boca, como nenê sem toca, como violão sem tocador, como orquestra no palco sem maestro. O tempo não é canhoto nem destro. Ora liberdade ora cabresto, o tempo se destempera para se recompor de outra forma. O tempo não para e ninguém lhe cutuca com vara curta como se faz com o cão. O tempo não mora. Namora. Excede-se em cada rosto de bebê no disfarce da face aveludada sedosa feita pera. Encurta-se no estrago que sulca o rosto, que se faz de morto para namorar janeiro. O tempo se mostra onde não deve e não deve se mostrar onde deveria. No tempo se instala o chip da vida – programas de adeus, de choro, de despedida e de morte. Quero um mote. Quero um bote. Um SA sem SER DOTE. Pacote de presente embrulhado de sonhos e desencantos, debulhados nas correntes das paixões dúbias enlouquecidas pelas ruas despudoradas e nuas. O tempo é como a gente quer que ele seja, mas se rende ao jogo sujo que ele inventa quando acaba com nossa estética. Tempo sem lógica, tempo sem métrica, tempo sem rima, tempo sem métrica.