[Andaduras do Tempo]

[Nos poentes sonolentos, eu cavalgo assim...]

Veranico... corte das chuvas das Águas;

acolhe-me a terra seca sob o sol abrasador.

Sinto o vento quente... espero a chuva solapar

de novo o vasto cerradão sequioso.

Queria sentir o cheiro do couro molhado do arreio,

o vapor quente que sobe do corpo do cavalo

banhado do suor da longa trilha.

Céu pesado sobre mim, e cavalgo... e penso...

Penso nela, penso em mim — perdidos? Sei lá...

Tanta coisa a gente perde...

Pensamenteio... diabruras de ideias loucas...

Recuso-me a acreditar que aquela bela vulgívaga

pudesse se apaixonar por mim, ou antes,

mais por este meu corpo, pois, afinal,

sendo vária, ela o desejava tanto, tanto...

que dizia se perder de si, em mim!

Sinto apertos no corpo e n'alma

quando penso nela... e penso tanto...

Mas até ela ficou para trás... noutro tempo,

noutro estado... Ah, vida à-toa! —

nem nisto há novidade: o que mais faz o tempo,

senão pôr para trás, as coisas, as pessoas?

Fica, ou mal fica, no [meu] presente,

esta minha cabeça que alguém vê de longe

na trilha que vai rumo ao poente;

quem me vê, nunca me sabe,

só eu me viajo, só eu só — é claro!

Erráticas trilhas, ermos de mim, em mim... mas pior:

ermo dela em mim, em irônico contraponto

com a memória do corpo... ou dos corpos,

pois ela também é memoriosa — ah, se é!

Veranico... trilhas e trilhas rumo ao poente,

vento quente nos galhos de agudos espinhos avermelhados,

flores lilases, desafiadoras, nos galhos das lobeiras,

tatu escapando ligeiro entre as touceiras secas,

grito esganiçado do anu-branco no galho do angá —,

no agora, os vestígios... ou mais propriamente, resíduos,

traça ruim do tempo a roer-me as entranhas... esquisito!

Ah, as boas andaduras de tempos ruins, ou de tempos bons...

diferença? Nenhuma, nenhuma — a andadura é uma só!

[Eu, sobre o meu cavalo, pensamenteio à toa,

estou longe de casa, longe de mim, e perto dela!]

[Penas do Desterro, 07 de fevereiro de 2011]

Diabos! Por que eu escrevo estas coisas... ainda?! Que doença, ou que besteira...

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 07/02/2011
Reeditado em 08/02/2011
Código do texto: T2777767
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