[O Fogo do Tempo]
Em torno do fogo, eu vejo a palha verde do milho a consumir-se... Verde, bem verde - mas o que é que resiste ao fogo? E a palha vai se tornando mais e mais seca, e vai sendo consumida pelo fogo...
E eu que trago em mim tantas vivas imagens de meus mundos, tantas dores, tantos descaminhos, e só algumas alegrias... Eu, para um falso alívio, tenho apenas o "fogo do tempo" que, ao contrário do fogo, mais atiça do que consome estas imagens, estas lembranças.
Ah, estes tormentos de noites escuras infinitas, sem lua a apontar o rumo da madrugada... Quem poderia chorar comigo? Quem se deixaria molhar pelas minhas lágrimas? Sempre, sempre um forasteiro, aonde quer que eu vá!
Viver é péssima escolha, as pessoas são [intrinsecamente] más, e eu sou, é claro, mau... A ilusão que a cena da vida me causa se dissipa, apenas se dissipa, inexoravelmente, mas sem jamais extinguir-se.
O "fogo do tempo" — será como o "fogo de gelo"? Será? Pudesse, socava o nariz abelhudo de quem me perguntar o que é o "fogo de gelo"! Só... rindo! Trocadilhando: o "fogo do tempo" arde, arde no templo onde cultuamos as nossas ilusões. Palavras criam vida, até sem a gente querer... isto é, principalmente a criam no longe da nossa vontade! O compromisso é de apenas escrever, o resto...
[Penas do Desterro, 04 de fevereiro de 2011]
[... E como sempre, comecei este texto a partir de uma "melodia magoada que não quer me deixar" — busquei alívio na escrita, no meu nada de ser. E outra vez, eu não disse nada, nada... terei de escrever outra vez, e outra vez... pois aquela melodia volta sempre e sempre, e com motivos diferentes, inesperados até por mim, que os carrego na mente... Agora, ela apenas se escondeu de mim; respiro, vou tomar um café. Que doença é esta?!