SEU AMIGO TEM PREÇO?
Ele me perguntou: ‘Quanto está pedindo por ele?’ Eu lhe respondi, sem pestanejar: ‘Não se vende um amigo. Estou lhe dando por não poder dar a ele o melhor.’ Ele riu, e logo se dispôs a ficar com meu amigo. Dentro do meu peito uma dor ia se avolumando e me paralisando. Será que terei realmente coragem de doar meu amigo? Fiz-me de forte. Estiquei-me o mais que pude e segui com minhas atividades corriqueiras. Mas a dor estava ali, corroendo, sangrando, gritando.
No dia combinado para sua partida, prestei atenção a todos os sons que indicavam sua chegada e sua alegria ao me encontrar. O som na porta do meu quarto, o choramingo quando ouvia minha voz; ao primeiro movimento do abrir da porta, entrava alegremente saudando-me com seu sorriso canino, abanando o rabo, pulando ao meu redor, dizendo-me: Bom dia, minha amiga!
Vi pela última vez, quando pulou na cama, acordou meu filho com lambidas e mordidas. Meu filho enroscava-se e ria disfarçadamente. Seu amigo ia embora, meu filho sabia, e aproveitava cada segundo. Chorei disfarçadamente... A vida é cheia de perdas, disse a mim mesma. Preciso me acostumar com mais uma.
Meia hora, antes de sua saída... Pus-me a chorar. Cobri o rosto com um lençol e ali deixei que as lágrimas aliviassem meu coração que sentia a partida do amigo. Levantei-me achando que ia suportar o último abraço, a última lambida... Mas o vermelhão do rosto denunciava as lágrimas que já davam sinal de que viriam em cascatas. Fui chorar aos borbotões enquanto meu amigo partia.
Meu filho ainda correu para onde eu estava e me fez um pedido que era o apelo do seu coração: ‘Mãe tem certeza que a senhora não vai ficar chorando pelos cantos? Ainda dá tempo de desmanchar a viagem.’ Abanei a cabeça e disse que estava tudo bem.Ouvi o carro saindo, e imaginei meu amigo sendo levado, sem saber pra onde, e o que viria depois...Foi aí que vi meu filho me espiando, e como eu; tentava esconder a dor que sentia.saímos do quarto abraçados, e fomos fazer uma atividade qualquer, mas o coração seguia o carro e imaginávamos o que estaria se passando com meu amigo.
Foi quando meu filho deu um grito: Mãe eu não quero outra coisa se não o meu amigo de volta! Era a desculpa que eu precisava, corri ao telefone, liguei para um amigo da família e pedi que fosse atrás do amigo doado, e explicasse o que se passava com meu filho. Escondi claro, que eu era a que mais chorava de arrependimento e saudade.
Não demorou, vi meu amigo chegando, e a parti daquele momento tomei uma decisão: daqui meu amigo não sai, a não ser quando bater as botas. Esse amigo é meu cão.