A LADEIRA DA SÉ.(OLINDA. PE.)
Chagaspires.
A água da chuva corria copiosamente, lavando o calçamento da ladeira da Sé.
Durante o reinado de Momo, ela fora cúmplice dos mais variados acontecimentos: brigas, amores, sentimentos rompidos, sorrisos perdidos, saudades contidas, alegrias e dores etc.
Ouvem-se ainda, os últimos acordes das marchas de blocos.
O ribombar dos trovões se confunde com o som do ilú e dos atabaques dos maracatus que subiram e desceram à ladeira.
O confete e a serpentina jogados pela gente a passar, vão de água a baixo, carregados pela chuva impetuosa.
A ladeira solitária e triste, contrastando com os dias alegres, sente a falta do vai e vem das pessoas a passar.
Já estava acostumada com o bulício da turba, toda vez que chegava um novo bloco.
Agora despida das alegorias e varrida pela chuva, carrega no semblante a saudade de antigos carnavais.
Parece que a natureza estava jogando toda sua ira em cima dela.
O vento frio vindo das bandas do mar sacode os fios dos postes, fazendo tremer as lâmpadas, parecendo os açoites dos feitores dos tempos coloniais.
A ladeira da Sé, já foi palco dos mais diversos acontecimentos: guerras, procissões, enterros, serenatas, intrigas, mas do que ela realmente gosta é dos dias de carnaval; mesmo sabendo que muitas loucuras são cometidas.
A insegurança tem causado problemas sociais dos quais ela não tem culpa.
Os tempos mudaram, mais a ladeira permanece a mesma.
Pertencendo a cidade monumento, ela se orgulha de estar incrustada em Olinda a centenas de anos.
É certo que a paisagem modificou. De uma simples descida descalça, se tornou em uma importante via calçada, onde os lampiões antigos foram substituídos por modernas luminárias, e a noite quando acesas, clareiam tudo ao seu redor, enchendo de esplendor todos que por ela passam.
Os pecados são coisas cometidas por simples mortais e não deviam ser imputados a ela.
Cantada em prosa e verso por artistas famosos, sua história, seus feitos heróicos percorrem o mundo.
Os turistas que por ela passam, ficam deslumbrados com a paisagem.
O verde mar, o imponente coqueiral, as igrejas em estilo barroco, tudo ao longo do caminho empolga e seduz, até o artesanato concorre para deslumbrar e trazer encanto.
Naquela tarde a ladeira curtia a dor de uma sexta-feira de cinzas, esperando que no próximo ano, seu espaço seja preenchido por fantasias coloridas, gente eufórica e sons de instrumentos musicais.
Com certeza sua fisionomia sorriria outra vez, trazendo de volta os dias alegres e irreverentes de um novo e contagiante carnaval.