Era sol
Era sol e tudo o mais girava quilômetros luz na cadeira de balanço onde guardei dois pensamentos inteiros – ele em pé com a língua de fora e as narinas arregaçadas - : Devorava esta carne enrugada de séculos guardada no congelador de mim dissimulando a capacidade de ferver meu sangue apenas com um sorriso secreto que teima fingir não dar? Ele não me dá nada, realmente. Apenas vai tirando, re-tirando cada pêlo que teima recobrir meus olhos. Arranca com aqueles dentes – vermelhos-azuis-amarelados – enquanto ouço um “adios muchachos compañeros de mi vida” à todo vapor nos meus ouvidos. E outro. Cheirava minha nuca como se comprasse um velho e bom perfume francês em banca de camelô desembrulhando peles que costurei para nunca mais me ver perdida? Apenas dois. E parecia que me comia com os olhos fazendo cantos palpitaram dores dentadas-lambidas mal sentidas por um segundo apenas. Fechei os olhos imaginando fumaça nos pensamentos, mas só encontrei fragmentos de corpos e bocas que não se encaixam em mim. Pensei que me comia, mas, na verdade, para além de mim, comia a foto pendurada na parede do self-service – 13,90 o quilo -.