Coisas da noite
Noite alta. Sono fugiu.
Deita levanta; deita levanta.
Nossa!... que noite comprida...
Espera sono deitada.
Na rua, silêncio soturno.
Passos soam; alguém
vai passando.
Ouvido apurado...
Vozes...
Uma canção desafinada...
parece lamento choroso.
Acompanham um andar trôpego
palavras confusas;
é u'a melodia conhecida.
Vai aproximando
ruído de pés que arrastam
num andar desigual.
Um mastigar de palavras
que soam desvairadas,
querendo atingir o mundo.
Pobre coitado!...
Choro convulso...
Mundo, o que fizeste com ele?...
Não. Não foi o mundo,
foi ele mesmo.
Não suporta a infelicidade
procura atordoar-se
para esquecer...
A desgraça é viscosa,
quando agarra não solta,
faz da pessoa
um trapo de gente.
passos cambaleiam;
o corpo desce como trouxa.
Sons confusos de nomes
chamados com angústia;
de gemidos estertorantes.
Momentos estremunhados
como barco sem rumo.
Ninguém a segurar-lhe a mão,
a apoiar sua cabeça...
Ali, parado, encolhido,
sozinho, doente...
mais da alma que do corpo,
abandonado ao relento...
apenas um cão vadio,
transeunte eventual,
lambe-lhe o rosto
numa carícia espontânea,
solidário inconsciente!...