JOÃO BRASILEIRO DE DEUS

Chamava-se João entre tantos outros e, como tantos outros, sonhava. Sonhava que era feliz, sonhava com um sertão adubado, florido, regado com as águas que caíam do céu.

Sua tez marrom, no entanto, assemelhava-se a cor da terra. Suas rugas eram a própria terra rachada pelo Sol.

Via, dia após dia, seu pequeno rebanho definhar e morrer. E com ele morriam também os seus sonhos. Por vezes, quase sem fé, proferia algumas preces. Preces essas que havia aprendido com a mãe - que a fome também levou. No pequeno fogão à lenha, a chama representava um ontem aonde tinha cabrito, feijão e farofa. Hoje mais nada.

Chamava-se João. Um brasileiro abandonado na aridez da avareza, desprezado em um sertão de covardias, esquecido na sua fome e nos seus sonhos.

Já sem forças para tentar a sorte de encontrar um preá para comer, jazia na sua casa de taipa, na terra que tanto amava e que tanto trabalhou para melhorar.

Chamava-se João, João de Deus. Um nordestino brasileiro, um ser humano, um “alguém” que viveu, que amou, que acreditou em Deus e nas pessoas, que foi feliz como pôde e que morreu com mais fome de justiça do que de comida...como tantos outros Joões, brasileiros de Deus.

verão de 2003

Joh Valentin
Enviado por Joh Valentin em 26/11/2010
Reeditado em 19/02/2024
Código do texto: T2637703
Classificação de conteúdo: seguro