[A Furna da Palavra]

Enfurno-me, quieto... penso,

mas em círculos infernais...

Em horas assim, desconfio

de tudo que eu disse,

e do que ainda vou dizer!

Esqueço-me de que sou um

“ponto único de cruzamento

dos aconteceres do mundo”,

e num balanço de resignificação,

surge esse impulso de anular-me

em comparações sem nexo!

A furna da palavra...

A quietude necessária

à contemplação de entornos,

à rumorosa escutação profunda,

ao apreender daquilo que,

em si mesmo, seja

mais que o cascalho,

mais que a impureza [do olhar?]!

A furna — o apurar,

num crisol, das sensações?

Fosse isto possível...

E se o que de mim tem valor

estiver justamente na ganga

que eu tento lançar fora?!

Pergunta inútil — sem resposta!

Ah, nada mais vão, mais fútil

que esta empresa, esta luta

para escapar da furna, e enfim,

ascender ao "estado de poesia"!

Quem sabe uma brecha...

Exatamente esta, por onde,

do fundo escuro da furna,

vazaram estas palavras?

[Em tempo — outra definição:

— escrevo para não dizer Nada,

escrevo para aprender a morrer!]

[Penas do Desterro, 25 de novembro de 2010]

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 25/11/2010
Reeditado em 25/11/2010
Código do texto: T2635743
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