Eu queria largar o poema ali
como quem esquece o que não tem importância,
largar abandonado ali um poema em todos os poemas,
mas ele sempre me segue como um cão fiel,
com seu faro infalível...

E há quem pense que o silêncio é isso,
o calar das palavras somente.
É também um quase não sentir
quando se está tão oco por dentro...

Que não se tenha piedade do poema largado
(e nem do poeta calado...)
O poema não é nem um ser vivo nem nada
não é nem animal e nem vegetal
e pode ir morrer aonde quiser,
sem que se dê por ele,
é apenas um poema
e ninguém vai se afeiçoar a ele...

De repente é assim, sem palavras no olhar,
sem qualquer emoção reconhecível no peito,
só um conhecido aperto, dorzinha de nada
e um poeta que mistura palavra e olhar...

Hão de me ver como quem volta do inferno,
como quem escapa súbito da morte
e vem por um deserto imenso
como quem se perdeu no tempo...

E perguntarão “quem é esse?”
imperfeitamente desfeito,
refeito perfeitamente,
parece que deixou de ser qualquer coisa
e talvez não seja mais nada.

Esse que é quem não é mais não é ninguém,
um catador de ventos e colecionador de pedras,
aquele que recolhe nos silêncios as palavras
como as de um poema que se abandona...


(Presidente Epitácio-SP, em 19/11/2010)
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 19/11/2010
Reeditado em 30/07/2021
Código do texto: T2625632
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