ENTRE DENTES  
                                Armando Silva Carvalho
                                     (poeta português contemporâneo)
                      

Deitado sobre ti
ensinas-me a sair
da treva.

Com a boca dorida
por tanta palavra
ensangüentada
devoro o teu cabelo
ouro que se desfaz
por entre os dentes.

E o teu sorriso
quando te penetro
ilumina súbito
a noite do meu corpo



  AQUELE  QUE ME TEM ENTRE DENTES




 

às três da tarde de um domingo qualquer, escrevo...


        
Já vai alto o dia de nossos desconfortos e ainda nos debatemos como náufragos em seus derradeiros momentos, somente gestos mecânicos, reflexos da luta recém travada pelos membros dirigidos por uma vontade de sobreviver nestas águas adversas do amor deseperançado.  Deste amor talvez equivocado, no tempo e no espaço, um desejo de ser com o outro que não se concretiza e fica assim este incômodo, algumas vezes minimizado por um recado, uma palavra aqui, esperanças sem corpos presentes, difícil sobreviver em ausência indefinidamente.
           Dessa forma, naquele que me tem entre dentes mesmo à distância, me extingo, desabam as poucas defesas ainda cambaleantes, estou entregue à sua indecisão e seu medo,
  que o que nele é grito e corte não passa de medo e insegurança, por que temer a mim? Mas não... não é a mim que ele teme, é a si mesmo, velha lição sempre esquecida, que ele teme a sua própria fragilidade e então grita,  implora para que eu o renegue, que eu o mande embora, por que esperar de mim o gesto derradeiro que o liberte, se não está em mim o dom dessa vitória, ação que só cada um pode ter sobre sua vontade ?
           E eu como árvore em campo aberto, inteira e indefesa, recebo agora seus receosos ventos, sua insegurança em ações  equivocadas.   Como encarar alguém que o enfrenta desarmada, que ainda e sempre o espera... quão insuportável deve ser a idéia de que alguém o quer de verdade, ele que está em luta constante com seus sentimentos... 
           E aos poucos a minha fortaleza desaba, meus galhos de árvore teimosa e sobrevivente  vão se inclinando rumo ao solo, folhas secando e os ventos das contrariedades retorcendo as minhas defesas já tão combalidas.
           O destino faz traçados intrincados  e cruéis,  pois aproxima aqueles que não poderá manter juntos, ou somos nós que sonhamos além das possibilidades?
           
            Seis da tarde do mesmo domingo...

           Esqueci tudo em um segundo, no exato segundo em que ouvi a voz dele. Nem o destino, nem os nossos sonhos equivocados...  ele me tem mesmo entre dentes,  me mordeu agora com amor em sua voz distante mas tão minha... renasço...





tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 26/10/2010
Reeditado em 26/10/2010
Código do texto: T2579922
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