Sonho de Madrugada
É estranho como nossas melhores obras são escritas madrugada adentro, como o silêncio, o vazio e o misterioso da noite aguçam nossos sentidos, dão tinta e luz a nossa pena.
Na insônia, o vagar das horas faz com que o corpo pese, mas a alma flutua. Todos sabem que não se escreve com o corpo, escreve-se com a alma, esta sendo obrigada a queimar inspirações difusas de um sono mal cobrado.
É ainda mais estranho ainda, quando se foge da cama pelo puro ato de ter uma ideia no meio do sonho, rompendo o encanto de poder sonhar. Como é cruel a vida de escritor, fazendo de si um meio para o sonho alheio, ainda assim feliz por não poder sonhar.
Não são poucos os que perdem o curto tempo de descanso para oferecer ao outro um pedacinho do céu, ao contrário, muitos somos, e eternos seremos nas memórias dos que nos bebem e a eles devemos brindar.
Como é bela a madrugada, somente o lápis e eu, sons etéreos, outros macabros, porém dificilmente não há que relatar. Gotas caem na pia, relógios raivosos, correndo com o tempo, portas rangendo e pilastras estalando. Um tanto obscuro, em vasta sinfonia, nem maestro faria maravilhosa orquestra de notas sombrias que o vento esfria na janela a assobiar.
Sim, este é o sinal que o Sol vem raiar, lá estou eu erguendo o olhar e notando o papel todo branco, então fora um sonho, e este nem pude gravar.