ABANDONO MINHA TERRA
Fecho a porta usando a tramela.
Deixo no casebre os cacarecos.
Numa trouxa tudo que preciso:
Uma cabaça, um bule velho,
Duas colheres de latão.
Pra vestir, uns trapos velhos.
Farinha seca e rapadura pra calar o bucho,
Uma casca ou uma pedra pra fabricar o cuspe.
No coração um aperto:
É a dor da mutilação.
Tive que largar o gado
Que vai perder-se na caatinga
Até morrer de exaustão.
A sede lhe fará tombar;
Não irá longe, pele e osso estão.
Abandono minha terra
Que herdei dos meus pais.
Cada esqueleto de árvore,
Cada pedra escondida:
Tem uma história, um sinal.
Das gerações que por aqui passaram,
Dos que aqui deram suas vidas.
Aqui foram derramados suor,
Lágrimas, sangue, sonhos perdidos.
Houve esforço, muito esforço.
Por muitas vezes, o fruto falhou,
As folhas caíram, a chuva não veio,
Os bichos morreram...
Até o barreiro secou.
O sertão me fez forte.
Insisti e não me arrependo.
Enterrei minha muié,
Também vi meus ‘fios murchar, ’
Qual feijão na vagem...
A terra está sendo fritada,
Há rachadura por todos os lados.
Mas uns homens chegaram,
Fazendo promessas.
Cri nas palavras adocicadas,
E fui levado qual nuvem pelo vento.
A morte continuou,
A fome aumentou,
E o pouco que tinha acabou.
A água mais uma vez não veio.
A semente tostou,
A barriga roncou,
Os vizinhos correram,
O cemitério duplicou,
Os que ficavam tiravam o chapéu;
Enquanto eu... Esperei... Não sei o quê.
Ai, quando os pássaros calaram,
A caça rara ficou... Com meus botões,
Percebi que estava sendo teimoso,
Ficar seria loucura,
E eu era ‘agricultou...’
Precisava de terra, semente e água
Para da terra, tirar meu pão.
Adeus minha terra, irei não sei pra onde.
Busco sustança e água pra não perecer;
E de amigos que lembrem meu nome.
Parto... Nem sei se volto.
Promessa... Não posso fazer
Sou homem de uma só palavra.
Então... Adeus... Pra nunca mais.