[Nossos Mútuos Desertos]

[Ilusão — a palavra quase salta — o que faço dela?!

Iludo-me pensando que faço, e faço nada?!

Ora... — sou apenas o frágil caniço pensante de Pascal!]

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Iludimo-nos... ou talvez não saibamos,

talvez não demos importância,

mas é fundamental que nos visitemos!

Ainda estamos vivos... não — é só outra ilusão!

Sim, visitemo-nos sempre — visitemo-nos

ainda que pela graça comovente, pela beleza

e pela leveza-pluma de um qualquer verso

que viaja, solto, no ar sem gente, parado...

Ou então, se tudo se desfizer em nada,

visitemo-nos [ainda] nas asas de um sonho

do qual a gente não quer acordar...

Cruzemos nossos mútuos desertos:

que eu possa, num rodopio de um abraço,

ver os teus pés nus, girando no ar,

e sentir profunda, mas sofregamente,

que existimos na duração do silêncio de um longo beijo!

É na rarefação deste deserto de nossas solicitudes —

nossos insistentes projetos de dar em nada —

que, cegamente, fabricamos quem pensamos que somos.

É na desolada paisagem [interna] deste deserto

que mais somos, que mais nos encontramos,

mas, paradoxalmente, mais nos perdemos...

Ah, mas se o meu deserto encontrar o teu...

Que loucura, que loucura é amar

na vastidão da mistura de nossas solidões!

Outros amores depois de ti? Nunca!

Outro amor seria apenas uma bandagem,

[ora terna, suave, e ora feita de loucura e espinhos]

sobre a cicatriz inapagável de nós dois!

Já nem sei mais o que te falo,

acho que estou te sonhando agora...

estou me sonhando em outro tempo,

estou variando, ilusionando...

Ah! Uma coisa te peço:

como naquele velho tango,

anda em minha ilusão, anda?

[Penas do Desterro, 15 de setembro de 2010]

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 15/09/2010
Reeditado em 28/12/2010
Código do texto: T2498737
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