MATIZES URBANOS
Carros circulam enlouquecidos pelas ruas, liberando ruídos horrendos, que estouram tímpanos! Tamanha a agressividade dos movimentos, que mais se assemelham a feras predadoras à caça de comida, prestes a se devorarem mutuamente. Ágeis e bravios, é como se possuíssem vida própria. Vida em que o poder da força bruta reina absoluto! Força que restringe seus condutores a condição de meros escravos, patéticos escravos...
Edifícios gigantescos, com seus robustos corpos de concreto e assustadores dentes de vidro, sufocam o espaço e encarceram o ar agonizante, sorrindo sarcasticamente para a extensão que dominam. Por entre os dentes, centenas de seres humanos mastigados e apavorados!
Lojas, bancos, sinais de trânsito, buzinas, apitos, anúncios e pessoas, muitas, muitas pessoas que andam apressadas de um lado para outro, como se numa busca urgentíssima e secreta. Ansiosas, trazem feições angustiadas de temor, ameaça e solidão nas faces e nos gestos. Suores de martírio! São como robôs programados a esmagar o tempo com fúria. Locomoção e sentimentos mecânicos...
Quais os motivos de tanta tormenta?
Por que, pela sobrevivência, soquear ao invés de afagar?
BHte, 1994.