[Por que Não Acelerar?!]
[Nós ficamos, pois o tempo acelerou a vida, enfim...]
Só.
Só.
Só,
e só!
Mais só que os escuros
e soturnos troncos das árvores
do estacionamento desse shopping,
eretos em meio aos reflexos das luzes.
Meus olhos desvairados perderam-se
em lindas pernas de mulheres,
em lábios tragando sensualmente
sorvetes de morango... e agora,
voltam-se para dentro de mim,
que remédio amargo... ou, que sina é essa
de eu nunca poder escapar ou faltar
a certos encontros comigo mesmo!
Nem tenho roupa para tais encontros,
mas tenho máscara — ou eu não estaria vivo,
e não teria a ilusão de ter um papel na peça...
Saio do mundo de sonhos,
e voo em linha reta, sem escalas,
para a minha solidão — é pouca, muito pouca —
para matar-me de ser só,
para ser mais trágico, eu precisava de uma solidão
daquelas que, a gente imagina, está a sofrer
o indivíduo sorumbático, de vida errada,
o habitante do quartinho da água-furtada,
ou o personagem de Knut Hamsun, em “Fome”
[eu venderia um texto meu mais barato
do que ele vendia os seus;
eu o trocaria por um afago a que um cão tem direito...]
Eu não tenho talento para uma solidão sofisticada assim,
sou rude, raiz sertaneja - sofro minha desgraça — só!
Se misturassem a minha pinga com o cano de um 38,
eu morria, mas não bebia — não aprendi a me dobrar!
Ah, pois... saindo do maldito shopping,
entro no carro... um só clic, e Zizi Possi
fala à minha origem italiana com “Lacreme Napulitane”;
arranca lágrimas deste descendente errante...
Ah, como é amargo o pão do desterro!
Desde Minas vim... e me perdi.
Mas agora, é preciso acelerar —
tudo mudou, sem nada mudar
nesta dor de ser no mundo!
E agora, que ironia!
— O tema, o velho-sempre-novo tema, é Cazuza —
Afinal, os eternos envelhecem também?
Cesar é velho; Sócrates é velho; Platão é velho; Heidegger é velho; Drummond é velho; Guimarães Rosa é velho; Garcia Marquez é velho; João Cabral é velho; Sartre é velho; Simone é velha; Freud é velho; Marcuse é velho; Che é velho; Fidel Castro é velho também, talvez não se tenha dado conta; Borges é velho; Saramago é velho; Fernando Pessoa é velho... — são todos eternos, porém... velhos?! [...e isto, num mundo sem deuses!]
— Mas como eu ia dizendo,
o tema é Cazuza, e Cazuza é velho;
“Down em mim” é um tema velho
— alguma resposta... alguma? Onde?
Eu não ouso, e nem o vento ousaria...
Acelerar para morte — tem graça?
Se alguém tinha a resposta,
já foi para outra galáxia... Que sei eu... sei nada!
Afinal — por que não acelerar?
Ficar até o fim, só para ver a cloaca da vida
alimentar a miséria da existência,
enquanto a madrugada anuncia
o fim da noite insana
— os faróis bêbados, o asfalto violento,
o vendedor de jornais,
num qualquer bar da Avenida São João?!
Alguma razão para não passar a régua agora?
Incoerente por natureza,
tenho direito à contradição:
aceleremos, por que ficar velho é uma merda só!
[Penas do Desterro, 04 de Setembro de 2010]