Aquela cozinha
Aquela cozinha onde tudo desembocava,
enorme como um salão de festa.
Lá desembocava a comida sem tamanho,
o violão a beira do fogão de lenha,
o café quente e forte aquecendo a alma.
Lá desembocava também o amor dos olhos adolecentes,
o amor proibido, presente mesmo não estando,
sofrido, machucanso os sonhos da alvorada.
Lágrima ali rolaram, risos ecoaram.
Carinhos tímidos de pai para filho.
Tesmunha ocular de tantos feitos.
tantos sonhos ali sonhados pereceram!
mas permaneceram na memória.
Pergunto-me hoje sem resposta:
Quem hoje nela vive, tem conciência do seu passado?
Ouve passos etérios?
Convive com seus fantasmas?
Ela sobrevive, quando muitos já pereceram
Mas tem no seu ar nossa essência,
nossas vozes ainda ecoam por lá,
como a dizer solene e teimosa:
Alguém que se foi, volta de vez em quando,
não se esquece tão fácil pedaços da vida que vivemos,
não se esquece o passado quando ele não se esquece de nós.