Desnecessárias catarses IV
(Um último poema para todos e para ninguém)
I
A madrugada é minha, só minha
E o absurdo silêncio é meu castigo
A solidão é minha maior virtude
Eu bem sei ser triste só comigo
E sereno com toda essa quietude
Num rasgo no peito me desabrigo
E nem careço de tanta solicitude
Carrego as culpas que não tenho
E dores tantas que eu nem sinto
Se me jogam é quando me mantenho
Num sofrimento que sempre minto
Cerrar os olhos e franzir o cenho
O golpe fatal eu sempre pressinto
De extinguir-me sou o próprio lenho
E de queimar-me de vez consinto
São tantas palavras que lanço em vão
Plenas de um inevitável esquecimento
Para fora nada e dentro imensidão
Um deserto imenso de sentimento
O ermo mais provável no coração
No vazio enorme de cada momento
Com o tempo se aprende desolação
E se convive bem com o tormento
Quando se finge que é imaginação
II
Agora eu fico só, só isso e mais nada
Agora espano o pó desses instantes
Há tanta distância, tanta estrada
Há tudo que nunca será como antes
Agora resta somente a palavra calada
E as tais perguntas tão inquietantes
Que sequer respostas mereceram
Por serem de fato desinteressantes
E por mais belas que elas pareceram
Agora não parecem tão importantes
Fico com o ônus, a culpa, a vilania
Com a responsabilidade pelos erros
Fico com o absurdo dessa poesia
Feita de desertos, abismos e desterros
Sou o monstro, o cão, sou o bandido
Sou o que tanto peca por omissão
O que mesmo calado tem ofendido
O que desconsidera a consideração
O que fica com o que foi perdido
E o que de reclamar sempre abre mão
Nem sei se sou forte e sensato por acaso
O que tem de buscar toda a compreensão
Sou sempre aquele que nunca faz caso
No caso de lhe arrancarem o coração
III
Mas e daí, quem é mesmo que se importa?
Eu sou o que detenho tudo o que foi dito
O que se cala e o que dá a cara à porta
E o que mantém um silêncio maldito
Que guarda a palavra que nunca foi dita
O que espera sempre por outra vez
O que sempre se recolhe em sua desdita
Dizendo nem sim nem não, nem talvez
Talvez encontre para tudo um sentido
Um rumo certo para tantos descaminhos
Talvez tudo seja só o que tenho colhido
Num jardim de estilhaços e de espinhos
Resta apenas essa capacidade de se refazer
Essa árdua necessidade de esquecimento
Essa paciência imensa de nunca dizer
O que foi mais lucidez que pressentimento
E é tão lúcida toda ferida em sua dor
Na saudade de emoções tão esquecidas
E é assim tão tolo saber que é e há amor
Feito de tantas palavras não proferidas
Ah! E é tão tola toda essa poesia triunfante
Essa espera por algo tão belo que não se tem
E que se vai tão inútil nessa catarse delirante
Nesse último poema para todos e para ninguém
(Um último poema para todos e para ninguém)
I
A madrugada é minha, só minha
E o absurdo silêncio é meu castigo
A solidão é minha maior virtude
Eu bem sei ser triste só comigo
E sereno com toda essa quietude
Num rasgo no peito me desabrigo
E nem careço de tanta solicitude
Carrego as culpas que não tenho
E dores tantas que eu nem sinto
Se me jogam é quando me mantenho
Num sofrimento que sempre minto
Cerrar os olhos e franzir o cenho
O golpe fatal eu sempre pressinto
De extinguir-me sou o próprio lenho
E de queimar-me de vez consinto
São tantas palavras que lanço em vão
Plenas de um inevitável esquecimento
Para fora nada e dentro imensidão
Um deserto imenso de sentimento
O ermo mais provável no coração
No vazio enorme de cada momento
Com o tempo se aprende desolação
E se convive bem com o tormento
Quando se finge que é imaginação
II
Agora eu fico só, só isso e mais nada
Agora espano o pó desses instantes
Há tanta distância, tanta estrada
Há tudo que nunca será como antes
Agora resta somente a palavra calada
E as tais perguntas tão inquietantes
Que sequer respostas mereceram
Por serem de fato desinteressantes
E por mais belas que elas pareceram
Agora não parecem tão importantes
Fico com o ônus, a culpa, a vilania
Com a responsabilidade pelos erros
Fico com o absurdo dessa poesia
Feita de desertos, abismos e desterros
Sou o monstro, o cão, sou o bandido
Sou o que tanto peca por omissão
O que mesmo calado tem ofendido
O que desconsidera a consideração
O que fica com o que foi perdido
E o que de reclamar sempre abre mão
Nem sei se sou forte e sensato por acaso
O que tem de buscar toda a compreensão
Sou sempre aquele que nunca faz caso
No caso de lhe arrancarem o coração
III
Mas e daí, quem é mesmo que se importa?
Eu sou o que detenho tudo o que foi dito
O que se cala e o que dá a cara à porta
E o que mantém um silêncio maldito
Que guarda a palavra que nunca foi dita
O que espera sempre por outra vez
O que sempre se recolhe em sua desdita
Dizendo nem sim nem não, nem talvez
Talvez encontre para tudo um sentido
Um rumo certo para tantos descaminhos
Talvez tudo seja só o que tenho colhido
Num jardim de estilhaços e de espinhos
Resta apenas essa capacidade de se refazer
Essa árdua necessidade de esquecimento
Essa paciência imensa de nunca dizer
O que foi mais lucidez que pressentimento
E é tão lúcida toda ferida em sua dor
Na saudade de emoções tão esquecidas
E é assim tão tolo saber que é e há amor
Feito de tantas palavras não proferidas
Ah! E é tão tola toda essa poesia triunfante
Essa espera por algo tão belo que não se tem
E que se vai tão inútil nessa catarse delirante
Nesse último poema para todos e para ninguém