Ternura
Ao me perceberes, inventavas a presença de uma ternura em mim contida.
Descobrias, num aceno, que forma eu tomava e assumia; E quais efeitos produzia nas auroras, nas correntes, nas areias movediças e nas malas, quando vazias.
Podias ser insensato e insano, podias ser um desastre, um dano, no entanto era como se fosses quase um tom de azul boiando sobre a névoa, sobre o campo, a cidade, quando deserta, certa de que havia no céu um outro azul de anil.
Eras, só pernas e leite. Eras boneca de louça e louça presente no enfeite de jardim. Eras sim.
Pendias para o lado que é oculto, vendias sustos e compravas medos, segredos num lenço que secava os elementos isentos de dor.
Assim, varrias à tarde, as varandas, as folhagens e a tua agonia. Sabias. Pressentias.
E através da presença pura, que só tem quem, do retrato, olha somente a moldura, olhavas para a ternura que inventavas e colocavas em mim como se minha fosse. E foi de tanto inventá-las, que enquanto eu te amava, tu te esquecias de mim.