ORIGENS: AS PRIMEIRAS IMAGENS
“A alma humana é um abismo escuro e viscoso,
um poço que se não usa na superfície do mundo”.
Bernardo Soares (Fernando Pessoa),
no Livro do Desassossego.
Das pastoris bucólicas e provincianas da infância e adolescência, sempre permanecem reminiscências dos folguedos, das primeiras descobertas do mundo e os iniciais portais de alumbramentos.
É dessa natureza sempre em ebulição dentro da gente que a POESIA nos remete aos escaninhos do sonho, vem à tona, pede passagem e faz estripulias em nossos sentimentos.
O alter ego que habita o ser poético só é mensurável em profundidade se essas tatuagens não perderam forma no temor ou no gozo.
O POEMA é o resgate dos insetos e dos bichos; dos cercados e dos pátios das casas; das amorosas árvores plenas de clorofila; das frutas “de matar a fome e de lamber os beiços”... Do campinho de futebol de defronte; dos primeiros encontrões e embates; enfim, dos “bichos-carpinteiros” que nos levavam aos arrodeios das pandorgas no céu e seus longos rabos tortos que prenunciavam enrodilhados futuros. ... A mão macia da primeira namorada, o primeiro beijo, a descoberta de que a “clara de ovo” poderia fecundar o ventre e produzir o choro e o riso.
Somos isso, um pouco do gene que nos faz humanos, condenados à provação material e espiritual. Nada nos trará de volta às tarantelas infantis, nem aos debruços adolescentes, porém o exemplar humano só é pleno se tiver o cordão umbilical metido na terra, na fenda original dos ventos e chuvas. Ali onde nasceram batatas, cebolas, mandiocas e floresceu feito uma lua crescente o pão de cada sol.
E, na misteriosa rosa das palavras, mãos postas, ao final do dia:
– Ave Maria!
– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2009/10.
http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/2352011