Nosso amor se cala

Em quantas palavras já te disse que te amo?

Não sei.

Todo dia eu te digo, no mínimo, que te quero.

Não tenho certeza, mas acho que nestes dias todos, não deixei de dizer do meu amor por você um dia sequer.

Não!

Com certeza falei do meu amor por você em todos estes dias.

E senti este amor do qual eu te falei todos estes dias.

Será o meu amor tão grande?

Será um amor que não teve inicio?

Já nasceu amor?

Já nasceu tão grande?

Talvez tenha nascido tão grande quanto a carência que havia em mim.

A carência que há em mim.

Tão grande como o velho hábito de ser sozinho.

O velho medo do envolvimento.

A velha hora que faz os dias longos.

E os dias são tão corriqueiros.

Todos os dias claros um raio de sol, quando acordo, nestas manhãs de inverno, mete-se pela fresta da minha janela a dentro e ilumina parcialmente meu quarto.

E caminha pelo quarto conforme sua natureza ordena.

O raio de sol não é o sol e, no entanto, aquece, brilha e dá luz como se fosse um pequeno sol que brilhasse em meu quarto.

O meu sentimento, por mais belo que seja, por mais intenso que seja, não é o Amor.

É uma centelha do grande Amor que eu teria que te oferecer para poder dizer que te amo.

A centelha do meu amor é insuficiente.

E, no entanto, não me canso de violar as palavras, ignorar os seus sentidos mais íntimos e reluto em não dizer que eu te amo.

Te amo!

Este amor pode afagar, tecer carinhos, dizer de amores, beijar tua boca e teu corpo, roçar a mão em teu rosto, sentindo em teus olhos o que tua boca não diz.

Mesmo assim, é uma imitação de amor.

É o amor sem resposta.

É o eco morto na garganta.

É a solidão a dois.

É a solidão resignada.

A solidão que convence em face da dor.

Amor, a vida pede a escolhas a cada momento, a cada instante da nossa existência.

A vida pede sentimento.

A vida pede atenção.

Há um chamado que não se ouve.

Há uma vida que não se aquieta.

O meu amor não te tem.

O meu amor se perdeu a andar sozinho, a falar sozinho de coisas que nunca viveu.

Tudo fantasia, tudo alegoria de um amor que precisava se expressar, mesmo que sonhando a si mesmo.

Mesmo que chorando a si mesmo.

Choram as lágrimas nos meus olhos crentes.

Nos meus olhos que fitaram os teus antevendo esperança pro meu desalento.

Meus olhos, enquanto não choram, ficam nus diante da tua beleza.

E, diante de ti, sonham os mesmos sonhos que minha alma sonha.

Os meus olhos agora se voltam para dentro de mim.

Se embaraçam nos meus sentimentos que ainda dormem enquanto a alma implora que se cesse o choro.

Os meus olhos dormem sobressaltados ante tanto sentimento que a vida me deu.

Que fazer do amor?

Até quando viver esta dor?

Até que dia a minha teimosia me deixará ser tão só?

Só... Como o toco negro da árvore que queimou.

Tão só como a primeira noite em que falei contigo.

Só como o coração que palpitou bisbilhoteiro.

Só como a primeira palavra que pronunciei na noite em que falei contigo pela primeira vez.

O amor que sinto por você, grande, como grande é o sonho, calou-se no meu corpo e o teu corpo nu, a tua pele fogosa, anseiam pelo amor.

Eu te amo.

Mas meu "amor" é pequeno.

Meu "amor" não se sustêm, não se mantém.

Sinto tuas mãos a procurar em vão o amor que o teu desejo pede. Sinto o teu corpo a desejar paixão.

Sinto nos teus gestos a angústia inteira do desejo que ainda falam ao fim de um amor contido, um amor que a natureza escolheu assim.

Meu amor é a simulação de coisas que já vivi.

O amor que eu sinto por você morre nas palavras, na minha intenção, no gesto puro do amor infantil.

Quando nos amamos, ao final, calamos os dois.

Eu calo cismado em face da alegoria que eu não decifrei.

Você cala...

Não sei por que.

Não sou eu quem vai dizer por que você cala.

Teus sentimentos dizem a você, e somente a você, por que você cala.

Qual silêncio viverá em tua alma para que não digas nada?

O sexo sem amor assemelha-se ao comércio do prazer.

Frágil máscara que se estampa nas faces dos amantes.

Trágica experiência para quem sente, para quem se embebeda e se perfuma com as seivas do amor.

O amor, dito assim, vivido assim, é farsa ao corpo.

Acabado o amor o que sobrou é quase nada... é nada.

Talvez uma pequena lembrança a recordar aflita o vazio indizível do beijo simulado.

Uma vontade louca de estar em qualquer lugar, menos onde se está.

No sexo onde se ignora o amor esquece-se a alma.

Afronta-se a si mesmo.

Planta-se em cova rasa a semente da dor.

E lágrimas regarão a planta quando nela florescer as flores da solidão.

Eu te amo muito e muito e muito...

e por te amar tanto assim eu não posso ser feliz.