Fénix
Migra de palmeira em palmeira. Enquanto vive, alimenta-se de mitos e engole os microrganismos que habitam nas águas quase a escaldar, depois protege as asas de vapor dentro das nuvens voláteis e frágeis iguais ao peso dum elefante voador; trespassa a frieza do canto próprio com fios de sol. Migra e leva o pó do outro corpo no bico; entrega-se ao voo circular das cores roxas, azuis, vermelhas, brancas, douradas e inicia o ritual com um coice, um tingimento de grito a gregos e troianos antes de pousar a eternidade nas palmeiras.
Nem todas as aves migratórias levam tudo consigo quando partem para outra paragem; algumas, deixam ficar o que construíram durante a vida e dela só vestem o sol. Tal esforço pode custar uma vida ou ganhá-la… Neste aspecto, esta ave, fora do primeiro contexto onde o texto se engana no nome, pode ser uma Fénix ou não…
Nem todas as aves migram. Concluo que há muitas espécies de aves, pelo menos, algumas, dentro duma variedade que, sim, levam tudo e, outras, que nada levam do seu ninho. Por esta perspectiva quem for «filósofo» e queira ter tempo, pode, ainda, conjugar perda e ganhos que ambas as condições podem ter e, em alguns aspectos, podem ser comparados — no mínimo dos enganos e nos testes consecutivos de resultado negativo.
Esta ave precisa de sol para aquecer o seu canto — este novo que encontra tem água que escalda e, por vezes, a pele larga as penas mais fracas na história, e as cores nas citações cíclicas, quase repetidas — o voo aborrece e constrange os anos e o instante. Tudo vai da temperatura das águas que o tom de voz entrega no bico da ave, que vai contrabalançar a distância de um voo a outro — a eternidade a pousar nas palmeiras.
Ana Maria Costa