Soberana da Noite

"A história é testemunha do passado, luz da verdade, vida da memória, mestra da vida, anunciadora dos tempos antigos."

CÍCERO

Flutuas, augusta rainha, no gasoso

etéreo entre o tudo e o nada.

Eu, cá embaixo, sigo ensimesmada

a caminhar pelas velhas calçadas.

Atravesso as ruas vazias andando, andando, andando...

Para tentar não pensar... Tudo em vão.

Só, na madrugada, acompanham-me

os fantasmas das lembranças todas da vida: sentimentos,

pensamentos, alegrias, sofrimentos, esperanças, encantos

e desencantos, sonhos que se esgarçaram no Tempo

e mesmo dolorosos tormentos.

Sensível e forte, luto com as armas das palavras, pois há

que defender sempre os bons e buscar JUSTIÇA:

Vivemos em um mundo tornado insano por criaturas que

jamais poderiam ser consideradas humanas.

Lua, tua contemplativa mudez faz-me sempre pensar

(quando queria não fazê-lo),

pois não estão em minhas mãos os pensamentos e os agires

dos seres medíocres e ruins mudar...

Ah!... como seria bom se pudesses falar e ao mundo relatar tudo

o que tens visto de onde te encontras desde o Início, e fazê-lo compreender que

sentimentos mesquinhos aviltam o homem:

maldades, indignidades, guerras... a Mestra da Vida nos ensina

que a nada de consistente e bom têm conduzido.

Ah!... se pudesses contar, do alto da abóbada azul-noite,

onde o Tempo não existe - o que viste, mesmo antes de a História existir...

tudo o que registraste em teu eterno observar, nos milhões de

anos que és da Terra, satélite lunar... quanto a todos poderias ensinar.

Ah!... dirias aos homens, com tua sabedoria, que a vida passa com a rapidez

de um corisco, o estrondo de um trovão, ou mesmo o átimo de segundo

para traçar-se em uma folha de papel, com giz, um risco...

Ah!... se lhes fizesses compreender que daqui

só se leva o bem que se faz, o Amor que se dá, o Pão que se divide...

Entenderiam essas criaturas que se isso fizessem, de nada mais carecem?...

Enquanto tu, Soberana da Noite, desde o Princípio segues

a flutuar no gasoso etéreo entre o tudo e o nada, eu, enlevada por tua beleza,

admirando teu prateado refulgir, recomeço a pensar

no que não queria. Lembro-me que Kierkegaard repetia:

"A vida somente pode ser compreendida olhando-se para trás, mas somente pode ser vivida olhando-se para frente"...

Ah!... Lua... Lua... se falasses e os homens ouvissem e apreendessem teus ensinamentos ... que mundo melhor este seria...

...e sigo meu caminhar ensimesmada... sobre tudo isto.