Os espaços, um bocadinho de tempo e a esperança
Depois de tanto tempo retornei ao lugar onde fomos felizes.
Foi de propósito, confesso: para ouvir o eco do que não falamos, aquietar de novo sua cabeça em meu colo, repaginar meus dedos tímidos, poderosos, pela sua pele... e para sentir o cheiro da alegria pura - porque nada sabíamos do futuro - e que sobrevive em mim, impregnou-se em mim e desde então sequer consigo sofrer sem pensar em você.
Essa única visita ao espaço do amor em nada se assemelhou às constantes idas ao momento em que nos despedimos - eu, da esperança, você, de qualquer promessa. Ir ali parecia com escrever na última página do caderno: a cuidadosa escolha do assunto, a letra curta, clara, espaçada, as horas das palavras limitadas às linhas; vir ao tempo feliz foi como conviver numa casa antiga e bela com fantasmas translúcidos e muito, muito concretos, as vozes murmurantes de cantigas e prazer, as vestes se desfazendo em poeira de encantamento...
E voltei sozinha - é o que sou, apenas não o sabia antes do que não houve entre nós; voltei em tentativa desesperada de avivar as lembranças, pois a tristeza de esquecer me apavora: sem a memória do amor, como reconhecê-lo novamente?
Não esquecer é manter a esperança de ver em outro espelho o reflexo da minha face amorosa, e quero, sim, empoderar minhas mãos em outros ossos e músculos e fluidos, embriagar-me em outras memórias, e, finalmente, pensar em você e escolher sorrir.