bagagem de mão
E se ontem abrigávamos a gestação desse agora de perplexidades, na bagagem de mão das coisas transitórias, que carregamos e entendemos como vida, hoje os fatos se revelaram mais fortes que os sonhos do passado, enquanto cresce o embrião desse futuro que incansável habita os porões da nossa vigília. Então tudo se enfeixa em um só estar vivo e a alma fica suspensa à espera de que o outro nos diga a palavra certa, de que um entendimento aconteça como mágica, enquanto as palavras sobrevoam a tela neste nosso diálogo sem sons.
Vínhamos vindo em nossos aconteceres há tanto tempo e quando nos cruzamos como quem esbarra em outra pessoa, pede desculpas e segue, parece que houve um segundo de hesitação, percepções além dos cinco sentidos que terminaram retornando pouco adiante. Naquele desenrolar de um passado recente gestava-se o momento de hoje, que no silencioso labor do destino ou da casualidade, girando como pião em superfície lisa, fez todas as rotas e volteios, aproximou e afastou, juntou e desmembrou, nesta azáfama de trabalhador do invisível e do imponderável. Fomos jogados assim, frente a frente, e aprisionados por elos para os quais nossas mãos não têm a menor serventia, nem sequer nossos supostos desejos e vontades e, sendo assim, seguiremos adiante qual pedras de um tabuleiro de xadrês comandadas pelas invisíveis mãos de um deus ou força que simplesmente age, não delibera sobre as criaturas, suas vontades, esperanças e sobre o que delas será feito.
Entretanto a explosão do presente prolongado em gerúndio, pelos efeitos da expectativa e do desejo que move as criaturas umas em direçao às outras, já iniciou entre nós seu ciclo de verticalidades intensas, já lança aos céus clarões de uma felicidade vislumbrada e desejada.
Na bagagem de mão das coisas transitórias, todos nós levamos estes embriões para que, encontrando momentos e aconchegos adequados, possam se desenvolver e se tornar reais.