Este meu canto breve
Eu canto porque o instante insiste,
Pelo que ao instante resiste.
Canto pela causa do cantar,
Como cigarra em noites de lua.
Canto até que meu canto feneça.
Até que minha alma pereça
E não possa mais estar.
Quem sabe, um dia, eu prevaleça
Acima desta torta vida
E lamba minhas feridas
Com a língua áspera e remissiva.
Só não quero o barulho do silêncio
Que faz crescer os frutos nos quintais.
Só não quero um sonhar a esmo,
Que independa deste cantar impreciso,
De que tanto dependo e preciso.
Renovo, enquanto meu canto existe,
Este meu cuidar de sonhos
Ao longo do meu caminho
E me proponho recolher
Folhas murchas e desgarradas.
Quero que ouçam a minha canção...
Sintam a minha canção tão fugaz
Que fala de heróis de papel.
Sobre tudo aquilo que não me dei,
Trago um mangue de lamúrias
E de confusões reticentes,
Ponteadas nesta canção ferida,
Tão ilógica e enlouquecida.
Um dia valerá a pena pegar o horizonte
E vigiar as estrelas de um novo tempo
Em que meu canto de palha
Se transforme em coisa válida,
No que consiste esta vida de nulidades.