Devaneios Noturnos V
Não durmo.
Há em mim tanto peso, que o descanso de algumas horas de sono, por pouco tempo que fosse, seria heresia às inúmeras idéias que povoam minha cabeça e desejam lugar de destaque, umas sobre as outras.
Sussurro no escuro. Testo o som da minha voz no ambiente vazio.
Peço clemência ao meu perverso eu criador. Culpo e abomino as sombras, criadas pelos reflexos das luzes multicores que refletem pela minha janela.
Embriago-me com palavras tortas. O lápis é meu cúmplice, e juntos, guerreamos contra uma folha amassada de papel que encontrei num canto qualquer.
Levanto e caminho pelo aposento nada agradável, mas que já é parte de mim, desde os cantos empoeirados ao limiar da porta de madeira barata. Fito meu rosto no espelho manchado: um completo desconhecido que conhece tudo sobre mim.
Sento numa cadeira, e equilibrando todo esse fardo deixo-me recostar à parede úmida. Tamborilo na mesa. Rabisco algumas palavras, transformo-as em frases e, de versos criados, faço um poema. Inútil.
Ao final de tudo, na última linha, escrevo: Paz.