[Na Vertical do Tempo]
[Elas não incrustam, não se agarram como
as cracas aos cascos das embarcações:
ao depois, a navegação será livre, como antes]
Se o tempo é vertical,
ou horizontal... faz sentido?
De que serve espacializar o tempo -
esse mistério da minha relação
com as coisas - se nem sei de mim?
Verticalizar — decidir... agir? Será?
Se não é, serve também...
No clic de um instante sem duração,
mudar o curso da monotonia!
Verticalizar o tempo seria assim,
algo como empurrar um corpo
para a queda-livre num abismo?
O que eu procuro, mesmo sabendo
que nunca achei... até ontem?!
Mas, hoje é hoje... hoje,
eu posso verticalizar!
Eu sei que ao cair da tarde,
quando o meu carro me leva
por ruas de ansiedade sem um quê,
elas surgem, faces limpas, belas...
Procuram um arremate para o dia,
querem alguém que está perdido,
e não sabe o que fazer com a tarde
caindo sem piedade, inapelavelmente...
Alguém disposto a verticalizar,
a dar aquele clic num infinitésimo da vontade,
a empurrar o corpo para o abismo dos desejos,
alguém que pensou nisto o dia todo,
que as sonhou até, e agora, é só um lobo errante...
Há nesta hora uma disposição de verticalizar
o tempo, transtornar os sentidos,
corpos na horizontal, à meia-luz...
Suave penumbra de um quarto no entardecer,
um lugar calmo, e um aroma de flores da noite...
Na certa que banalizei a idéia...
mas, que estranha história é essa que se dá
assim, rápida, na vertical do tempo...
O incerto bote da cascavel — quando?
[Se não fui obscuro o bastante,
então, fiquei aquém da intenção!]
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[Penas do Desterro, 25 de fevereiro de 2010]