[A Sombrinha Azul-Florida]
[Em algum ponto de minha estrada, eu vi esta história]
Rangendo molejos sem unto,
a charrete dobrou a curva do estradão.
O dia era de festa, alegrias, esperanças;
mas estes meus olhos sabem, desde cedo,
cavoucar tristezas em qualquer cena:
os sulcos das rodas da charrete na poeira
marcavam um compasso de dor
em meu peito apertado.
Talvez aqueles sulcos quisessem
dizer-me qualquer coisa...
No murmúrio do vento apagando
o traçado da charrete na poeira,
um prenúncio do [escasso] tempo porvir?
A noiva, com a sombrinha azul-florida
cuidava uma sombra para os dois;
ele sacudiu as rédeas e apressou
o passo da parelha de cavalos
com um chiado na língua.
[Da varanda, eu os vi desaparecer na estrada,
E no tempo... E então, eu sabia que eu ia envelhecer...]
Trinta e cinco anos depois,
pela porta do casarão da fazenda,
sai um tosco esquife: ele parte, ela fica.
Lá dentro, ergue-se o doloroso pranto da perda...
Ela chora a perda de um amor tão venturoso
que, se de algum consolo serve,
não lhe deixa memórias de dias ruins.
Agora, ela trilhará sozinha o resto dos seus dias
e haverá somente um para a sombra
daquela sombrinha azul-florida.
Ah, que inveja eu tive dele!
[E eu... eu envelheci só, e em silêncio]
[Penas do Desterro, 08 de maio de 1999]
[excerto do meu Caderno 1]