É um não querer mais que bem querer

É como se você fosse a sombra que se afasta do sol, por mais que ele se levante, por mais que ele tente se aproximar. Você foge, se esgueira pelos cantos, se apóia por trás das paredes, se deita sob os móveis, se estende sobre os campos entremontes, se esconde, medrosa e tola, ingênua e sorrateira, atrás do que você finge ser.

E, vai ver, somos todos assim. Sombras. O que realmente somos é a mancha negra que anda deitada. Vai ver somos nós que a seguimos. E escondemos o que realmente somos no chão, nas paredes, contra o sempre investigativo e intrometido sol. Somos disformes, crescemos, engordamos, emagrecemos, diminuímos. Pretos, frios.

Quem sabe, além de tudo, esse viver na horizontal também não quer dizer alguma coisa.

Então, você é a sombra a se esconder da sombra. E é por isso que quando nos unimos somos tão ‘uma só’. De não se conseguir distinguir os limites e as formas exatas, estamos diretamente ligados, embora os corpos sejam distantes. Como se fugíssemos de sóis diferentes. E não estivéssemos mais sós, estando em apenas um.

Mas por mais perto que estejamos, sombras, nossos corpos se afastam contrários. Se bem que nos braços laçados tornamo-nos um, de novo; mas muito rápido.

Muito rápido, mas dá para sentir o balançar cadenciado do seu coração se ajustar com o entusiasmo contido do meu, – Como dois cronômetros se igualando – e as sístoles e diástoles começarem a ocorrer simultâneas; como se um peito dissesse para o outro “Muito bem, nos encontramos novamente daqui a 500 mil batidas, ok?”.

Ok. Nem uma a mais, nem uma a menos.

Por que se esconde tanto? Somos tão iguais que a ferir me doeria.

Dou-lhe, pois, o dom da ignorância, do não saber. E assim, não vai dormir com o peso de ter-me machucado. Já que minhas feridas também doem em você.

E assim estamos presos – ou eu estou – ao abismo dançado dos peitos, às badaladas infindas dos relógios e aos pensamentos que passam vez ou outra.

Acontece.

Vou então, embalado pelo fluir do sangue nas minhas veias, vivendo de 500 em 500 mil batidas.

Joao L Terrezo
Enviado por Joao L Terrezo em 12/02/2010
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