[Alma Errante]
Dormi fora de hora, pois durmo em qualquer hora. Em conseqüência, eu estou quando quase todo o resto do mundo, gente que tem juízo, não está. Quando mais sou, é quando não estão os outros?! Será? Quando eu estou, o que sou, se os outros, repito, com mais juízo, não estão para falar-me de mim?! Sozinho, eu sou o quê, se só sou com os outros, nessa errância de ser que me plange?
Se a gente dorme, a gente não é mais, e de nada adianta, em tétrica reza, pedir a Deus que cuide de nossa alma, se morrermos sem acordar! Dormindo, a alma não está, saiu a passear... e se a morte acontecer, é por que, de certo, a alma achou coisa melhor que fazer, e decidiu não voltar para este perecível corpo. Então... para que pedir, naquela reza que tanto me amedrontava, para Deus cuidar...?
A Energia Vital, habitante esconso do âmago de terríveis forças destruidoras, deve estar ocupadíssima com os mistérios da Física... os campos [de força] capazes até de desviar a trajetória da luz, de engendrar marés nos oceanos (que "coisa" é essa que há no espaço?), a energia nuclear... os asteróides errantes que podem aniquilar tudo numa colisão com a Terra. O que é, de fato "massa", essa coisa que aumenta em velocidades próximas daquela da luz?! "Um quilo" de feijão viajando a velocidade próxima da velocidade luz alimentaria ainda mais pobres ... é isto?! E a subversão do tempo então?
Ora, pois! Com tantas maravilhas no universo, por que diabos ainda haveria esta assim chamada "Energia Vital" de ocupar-se dos destinos de uma reles alma, uma alminha assim pequena, que saiu de seu corpo e pôs-se a errar pelos caminhos do Hades?! Com efeito! Dessa, Caronte, e depois as Parcas, saberão o que fazer! O poeta estava errado, não há o "se" - a alma é pequena mesmo, e nada, nada vale a pena!
Por que tenho as idéias que tenho?! Ah, não, não quero saber a resposta! Esqueci como durmo. Vou tomar um bom copo de vinho chileno para ver se me lembro... a ver se a minha alma errante ainda volta para este corpo cadente. Amanhã, com a luz dia, quem sabe...
[Penas do Desterro, 02 de fevereiro de 2010]