coelho selvagem.
Eu quase fui atropelada por um caminhão uma vez, pneus de borracha derrapando contra a estrada molhada. Enquanto o motorista saltava de seu trono de dezoito rodas pra checar se eu estava bem, lá estava eu deitada contra o asfalto cheio de poças, dizendo-o não se preocupe comigo, senhor. Agora são só mais três milagres até que eu vire uma santa (eu tinha pesadelos muito piores com a qual me importar).
Coloco um cigarro entre os lábios, e o terror de dor-vermelho-sangue-por-favor está morno no meu estômago, e todos eles dizem pare, pare, isso não é bom pra você, você não vê no que está se tornando? Não percebe que estão todos indo embora? Não sabe que está desmoronando? E eu rio, porque ainda não sou feita de cinzas, cinzas, e não caí ainda. Eu sou uma torre, uma ponte, um pássaro, uma gota de chuva. Posso suportar tudo e flutuar, e quando atingir o solo vou simplesmente ser sugada para cima de novo, não é verdade?
Tiro as cascas dos meus machucados, limpo minhas lágrimas com as costas da mão, e este é o meu inferno. Este não é o meu lar. É aqui que eu posso acabar dormindo pra sempre, o sono é irmão da morte; e eu penso em como tudo o que desejo são flocos de neve e asas de Ícaro que não derretam no sol. Todos eles me perguntam quem eu sou, e eu digo que sou Alice procurando pelo País das Maravilhas, sou o príncipe encantado desejando beijar sua amada morta, sou a pomba de Noé em uma terra encharcada, que não deseja nada além de um galhinho de oliveira.......
E esta noite eu sou um coelho selvagem, que se enterra no chão de inverno tremendo e com frio, se perguntando pra onde diabos todos foram.