[No Tempo dos Hibiscos Vermelhos]

... E caminhando ainda mais, cheguei a um extenso muro escondido por uma basta cerca viva de hibiscos vermelhos. Em outros tempos, eu colhia uma flor de hibisco, destacava o cálice, e sorvia as gotas deliciosas que havia ali, no nectário da flor... descuido meu, descuido mesmo: eu nem cuidava estar roubando a alegria e o alimento dos ágeis cuitelinhos!

Hoje, nesta rua triste dos meus dias, não os vejo por aqui, esvoaçando em rápidas visitações às flores... também pudera: em todas as flores que eu abordei, e foram muitas, não tinha nenhum néctar! Errei de estação? Cheguei tarde, cheguei cedo? O hibisco produz flores o ano inteiro... parece. Mas e o néctar para os cuitelinhos... e para mim — quando é que tem?!

Ah, estes hibiscos que as pessoas nem veem, nem sabem o nome, de tão comuns, tão aparecidos — o que é que me dizem? Que na vida, os meus tempos são sempre errados, são fora do tempo certo... o tempo certo, — parece, não sei — é só ao depois, só ao depois... Eu, uma atônita criatura do instante, vivo a fuga, a perda de todos os instantes! E o néctar de cada instante, de tão raro que é, mal posso fruir, pois já se vai de mim... e de novo, é preciso engendrar outro instante com a sua rara gota de prazer! Ah, vida incerta! Ah, esses ingratos hibiscos vermelhos!

[Vale a pena essa constante e renovada incerteza de ter?]

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[Penas do desterro, 15 de janeiro de 2010]

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 16/01/2010
Reeditado em 10/07/2012
Código do texto: T2033849
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