Atendendo a inúmeros pedidos, (mentira, confesso foi apenas um), resolvi continuar a contar novas experiências do nosso já conhecido e amigo, Da Paz! Só o faço em respeito e consideração à solicitação, repito, de uma nobre leitora.
A verdade é que as narrativas que dizem respeito ao Da Paz, para a grande maioria das pessoas pode parecer uma grande mentira, por isso relutei um pouco em trazê-las a público.
- Mas alto lá! Na vida eu nunca menti!
É certo que às vezes invento um pouco, coloco uma frase aqui, crio uma outra situação ali, mas no fundo, no fundo, a matéria prima da narrativa é totalmente verdadeira. Os fatos realmente aconteceram! Por motivos óbvios (é preciso manter a integridade moral do Da Paz, afinal quem nunca vacilou e não derrapou no gramado dos jogos da paixão?), não posso apresentar provas contundentes, mas, tem muita gente que sabe que estou relatando a verdade!
Mas vamos ao que interessa, depois daquela primeira noite que perpetuou o sol na cara do nosso amigo Da Paz houve sim muitas outras partidas. E levando a sério a frase que diz que: A prática leva à perfeição, Da Paz acreditem ou não estava jogando cada vez melhor, e em plena condição física e técnica. Enfim, para usar um jargão popular do esporte bretão; Ele tava batendo um bolão!
É certo que às vezes era preciso fazer mil peripécias e inventar absurdas desculpas para comparecer aos jogos, (afinal era um jogo por semana) e o seu repertório já estava se esgotando. Assim um belo dia ele anunciou solenemente em casa, que seguindo as recomendações do cardiologista resolvera cuidar um pouco mais da saúde praticando esporte para combater o sedentarismo.
Assim, comprou tênis, calção, agasalho esportivo, estava todo aparelhado, e pra não dar trabalho em casa, mandava lavar tudo em uma lavanderia e deixava todo o seu equipamento no escritório. Resolveu assim o problema crucial da ausência para cumprir o comparecimento nos jogos semanais. Além do mais havia ainda os jogos em casa e ele não podia dar mole Sabia muito bem que quem não comparece, abre concorrência! Mas ele tinha um pique incrível pra jogar todos os dias se fosse possível ou necessário.
Ele estava literalmente a todo vapor, um dia, no entanto pintou um jogo em pleno sábado, mas não um sábado qualquer era simplesmente o dia do aniversário de um dos netos. Ele não podia faltar à festa e não podia também de jeito nenhum deixar de comparecer ao jogo! Afinal, nenhum bom avô que se preze deixaria de comparecer a festa de aniversário do neto, e Da Paz era um avô exemplar e acima de toda e qualquer suspeita! E nem um cinqüentão apaixonado perderia uma partida com uma gata-de-olhos-de-mel!
Mas a paixão por mais sublime ou tresloucada que seja leva qualquer um à atitudes inusitadas e impensáveis. No fundo Da Paz sabia que mais dia menos dia o jogo podia acabar e era preciso dançar enquanto houvesse música, e jogar enquanto houvesse jogo!
No entanto o que não lhe faltava era imaginação, afinal a gata-de-olhos-de -mel era uma fonte inesgotável de inspiração. Festa de criança não passa das onze da noite, e ele já havia anunciado que o seu “jogo” seria no domingo de manhã, como a partida era em outra cidade ele iria tão logo terminasse a festinha de aniversário, queria estar inteiro para a partida.
Ninguém colocou qualquer objeção, afinal era visível que depois que começara a praticar esporte Da Paz vivia sempre de bom humor, sempre alegre, prestativo, e o melhor de tudo, vendendo energia e saúde!
Mas como eu já disse, Da Paz sabia que não há mal que sempre dure e nem paixão que não se acabe! Um dia ou outro a casa podia cair, e caiu! Nas viravoltas que o mundo dá não lhe era possível ficar vinte e quatro horas por dia dedicando-se total e exclusivamente à gata-de-olhos-de-mel! Era inevitável, e oito meses depois o campeonato terminou.
Da Paz desmoronou solenemente sobre seu próprio alicerce, no entanto era preciso manter as aparências, ele não podia deixar a peteca cair, e apesar dos pesares o sol continuou a lhe brilhar no rosto. Por dentro, no entanto, estava tudo nublado e ele se via totalmente mergulhado no olho de um furacão.
Foram quatro meses de verdadeiro martírio, a gata-de-olhos-de-mel continuava desfilando a sua juventude e gostosura e quando encontrava ou passava pelo Da Paz fazia questão de literalmente lhe atazanar a paciência fazendo-o lembrar de tudo o quanto ele perdera.
Mas a vida é cheia de surpresas e o sol voltaria a brilhar intensa e verdadeiramente no rosto de Da Paz, havia ainda muito jogo pela frente, e quem viver lerá!
antonio carlos de paula
poeta e compositor
www.antoniocarlosdepaula.com