Um lugar na lembrança
A menina olhava o riacho que corria manso sobre as pedras. Nas bordas, as espumas da água misturavam pequenos gravetos, folhas e pétalas de flores nativas. As moitas de São José, as quais estavam carregadas com suas flores brancas, ficavam nas margens exalando o seu perfume forte e inconfundível. Na margem direita, o jenipapeiro debruçava-se faceiro sobre o leito, as folhas balançadas ao vento brincavam com os raios de sol e formavam figuras inusitadas e curiosas no movimento das águas. Em um dos seus galhos ficava o ninho da juriti, que de vez em quando presenteava o dia com seu canto nostálgico.
Um casal de libélulas veio de longe e num voo preciso tocou a água três vezes, como se estivesse exibindo uma dança graciosa.
Então a menina entrou no riacho. E sentiu o frescor da água, o seu gosto e até o seu cheiro. E olhava cada detalhe daquele lugar com toda a atenção, pois queria que em sua memória tudo ficasse registrado: o som da água correndo, o movimento formado a um canto onde o riacho fazia uma pequena curva, a textura das pedras de seu leito. E ela conseguiu. Ainda hoje, depois de mais de quarenta anos, ela pode sentir todas as sensações e emoções que aquele lugar, tão especial, provocava nela.