[Às Portas de Mim]
["Oh, metade de mim..."]
O clac azeitado da fechadura
deixava lá fora a noite,
os estranhos, os perigos.
Por uma fresta no alto da porta
o dia estava indo embora...
Hoje sei bem que um tranco só
e a velha porta de duas folhas
cederia escancarando as nossas vidas.
Mas quem daria esse tranco,
quem forçaria as portas de guarda
de um santuário de pobre?
Em contraponto, eu pergunto:
se hoje eu estou encerrado
na construção que me sepulta,
quem forçaria as portas
que dão para este calabouço,
quem bateria às portas minhas?
[Ninguém sabe quanto vale, logo,
ninguém paga o preço real de ninguém,
e se mais clareza me for demandada,
direi que clareza maior não pode haver
que mirar as áscuas na água do fundo
de um poço quando sol está a pino;
assim, quem se arriscaria a olhar
para o fundo escuro do poço de mim?
Cada sonho, é um sonho e pertence
ao particular instante que o engendrou]
[Penas do Desterro, 08 de janeiro de 2010]
[Excerto do meu Caderno 4]