" Lairzinha não foi "
Evaldo da Veiga
Estávamos em meados de janeiro. Lairzinha fez seis anos em
21 de novembro eu no Natal, já havia passado algum tempo,
mas gostávamos de dizer que tínhamos a mesma idade, seis aninhos.
Meu pai resolveu que eu ia estudar na Escola Particular de Dona
Maria Yvone que ficava lá no Largo da Batalha. Nunca me vi tão empolgado. No Colégio Público só aceitava crianças com sete anos e essa espera seria angustiante.
Corri para avisar a Lairzinha e esperançoso que ela também fosse
estudar comigo. Pedi a Dona Rosa que fez um semblante triste
e foi logo prevenindo: - o Silvio não é bom para essas coisas,
ele vai dizer que é bobagem e que não vai gastar dinheiro à toa.
Mesmo assim solicitei que ela pedisse a ele, quem sabe... Ela pediu, e para tristeza maior, ele ainda deu um fora na Lairzinha, dizendo que ela só sabia inventar o que não prestava. Eu já não gostava do seu Silvo, desse dia em diante eu seria até capaz de gostar do Araponga que me deu a paulada, do seu Silvio jamais. Os olhos da Lairzinha estavam úmidos, era um choro contido e bem triste.
No meu primeiro dia de aula fiquei impressionado com a Dona Maria Yvone, que de fato era uma jovem professora e muito bonita. O tempo todo de aula fiquei olhando o rosto dela, meio disfarçado, e quando ela ia ao quadro negro eu olhava as pernas.
Vim pra casa correndo com os cadernos debaixo do braço, molhados de suor, eu ainda não tinha uma pasta. Lairzinha me esperava e perguntou o que eu aprendi, e eu respondi que a Professora era muito bonita, foi o que me veio no repente. Lairzinha ficou bem séria, carinha amarrada, e perguntou afirmando:- mas você não vai olhar pra ela não, né?! Fiquei quieto e triste, não conseguia ser fiel a Lairzinha o quanto ela merecia, e isso me machucava, fazer o que?
Par quebrar a tristeza chamei Lairzinha para brincarmos de Gato e Rato. Era assim: eu pegava a mãozinha esquerda dela e começava segurando a pontinha do dedo mínimo e ia à direção dos outros dedos. - "Seu mindinho, seu vizinho, pai de todos, fura bolo, mata piolho...” e apontando para o centro na mãozinha perguntava: - cadê o queijo daqui? Ela respondia com a voz límpida, plenamente cristalina e esboçando um sorriso que eu sempre lembrava depois de rezar antes de dormir: - o Rato comeu!- Trotando com os dedos médio e indicador, eu partia da sua mão, passava pelo braço e antebraço e ia dizendo:- “lá vai o Gato atrás do Rato, lá vai o Gato atrás do Gato....” quando chegava às axilas eu fazia “cosquinha” e Lairzinha sorria o sorriso mais lindo do mundo. Eu continuava fazendo “cosquinha”, e vinha sua gargalhada com dobres,
que ecoava dando beleza ao nosso bairro, DANDO BELEZA AO MUNDO.
N - Imagem, Tela do Salvador Dali
evaldodaveiga@yahoo.com.br
Evaldo da Veiga
Estávamos em meados de janeiro. Lairzinha fez seis anos em
21 de novembro eu no Natal, já havia passado algum tempo,
mas gostávamos de dizer que tínhamos a mesma idade, seis aninhos.
Meu pai resolveu que eu ia estudar na Escola Particular de Dona
Maria Yvone que ficava lá no Largo da Batalha. Nunca me vi tão empolgado. No Colégio Público só aceitava crianças com sete anos e essa espera seria angustiante.
Corri para avisar a Lairzinha e esperançoso que ela também fosse
estudar comigo. Pedi a Dona Rosa que fez um semblante triste
e foi logo prevenindo: - o Silvio não é bom para essas coisas,
ele vai dizer que é bobagem e que não vai gastar dinheiro à toa.
Mesmo assim solicitei que ela pedisse a ele, quem sabe... Ela pediu, e para tristeza maior, ele ainda deu um fora na Lairzinha, dizendo que ela só sabia inventar o que não prestava. Eu já não gostava do seu Silvo, desse dia em diante eu seria até capaz de gostar do Araponga que me deu a paulada, do seu Silvio jamais. Os olhos da Lairzinha estavam úmidos, era um choro contido e bem triste.
No meu primeiro dia de aula fiquei impressionado com a Dona Maria Yvone, que de fato era uma jovem professora e muito bonita. O tempo todo de aula fiquei olhando o rosto dela, meio disfarçado, e quando ela ia ao quadro negro eu olhava as pernas.
Vim pra casa correndo com os cadernos debaixo do braço, molhados de suor, eu ainda não tinha uma pasta. Lairzinha me esperava e perguntou o que eu aprendi, e eu respondi que a Professora era muito bonita, foi o que me veio no repente. Lairzinha ficou bem séria, carinha amarrada, e perguntou afirmando:- mas você não vai olhar pra ela não, né?! Fiquei quieto e triste, não conseguia ser fiel a Lairzinha o quanto ela merecia, e isso me machucava, fazer o que?
Par quebrar a tristeza chamei Lairzinha para brincarmos de Gato e Rato. Era assim: eu pegava a mãozinha esquerda dela e começava segurando a pontinha do dedo mínimo e ia à direção dos outros dedos. - "Seu mindinho, seu vizinho, pai de todos, fura bolo, mata piolho...” e apontando para o centro na mãozinha perguntava: - cadê o queijo daqui? Ela respondia com a voz límpida, plenamente cristalina e esboçando um sorriso que eu sempre lembrava depois de rezar antes de dormir: - o Rato comeu!- Trotando com os dedos médio e indicador, eu partia da sua mão, passava pelo braço e antebraço e ia dizendo:- “lá vai o Gato atrás do Rato, lá vai o Gato atrás do Gato....” quando chegava às axilas eu fazia “cosquinha” e Lairzinha sorria o sorriso mais lindo do mundo. Eu continuava fazendo “cosquinha”, e vinha sua gargalhada com dobres,
que ecoava dando beleza ao nosso bairro, DANDO BELEZA AO MUNDO.
N - Imagem, Tela do Salvador Dali
evaldodaveiga@yahoo.com.br