Sutilmente.

Amor assusta e dói, mesmo quando é só prazer.

[Marla de Queiroz]

O único som que escuto daqui é o da chuva caindo. Como se lá fora fosse extensão do que sinto por dentro. O medo hoje foi personagem principal do meu palco. Eu não soube lidar com a notícia repentina. Não soube lidar com sua chegada. Me escondi. De você e de mim mesma, porque não soube lidar com esse prazer que você me oferece por algumas horas. Sou capaz de montar toda a cena mesmo sem olhar nos teus olhos.

Você chegaria com o sorriso que eu mais gosto, aquela mistura de menino abandonado com homem que sabe o que quer, me abraçaria sem ao menos dizer "oi" e só me largaria depois de sentir que cada pedaço do meu corpo já estava entregue ao teu. Sentaríamos em algum bar-da-vida, você pediria uma dose de whisky sem gelo, como sempre faz, e eu uma coca-cola estupidamente gelada. Você diria que eu tinha que parar com esse vício de coca-cola, e eu responderia que nem morta. Você sentaria na minha frente e diria que nunca sentiu tanta saudade como da última vez. Eu saberia que aquele teu texto era ensaiado, e mesmo assim, me abriria num sorriso sem igual. Ficaria vermelha ao dizer que desejei você durante todos os segundos em que ficamos longe um do outro. Você tocaria minha mão e nada iria dizer. Só ficaria me olhando com a mão sobre a minha. Eu ia suspirar algumas vezes.

Faz tanto tempo desde a última vez! Que eu quase tinha me esquecido de como era teu cheiro. Mas bastou você chegar perto, que todos os meus sentidos se lembraram do que eu mais amava em você: teu cheiro, teu gosto. Seria difícil olhar nos teus olhos de novo, porque depois que olhasse, seria mais difícil ainda parar de te olhar.

Depois de uma eternidade me olhando, você levantaria, me daria a mão, e a gente ia pro lugar de sempre. Calados. Sem dar nenhuma palavra sequer. Como se nosso silêncio falasse por nós dois. E falasse tudo que engasgado, nunca saía. Eu iria devorar você como se o mundo terminasse amanhã e te amaria com a mais pura e forte intensidade que vive em mim, porque meu desejo era explosão junto com o teu. Faíscas saíam fáceis entre nossos corpos e o quarto respirava amor. Guardado. Enterrado. Desenterrado. Muito mais que desejado. Eu, mais uma vez, me entregaria inteira pra você. Você, completamente meu, falaria tudo que eu queria escutar e eu acreditaria em cada letra que você pronunciasse em meus ouvidos. Nosso suor se misturaria e nem mais saberia dizer onde eu terminava e você começava. Dormiria em teus braços, sonharia com o encontro, e acordaria com sorriso leve no rosto em perceber que não foi sonho. Algumas horas passariam. Me lavaria de você, com você. Você se despediria e mais uma vez, iria embora. Sem data pra voltar. Desfazendo o laço feito durante aquelas horas anteriores. E pronto.

Assim seria, meu amor. E eu não estou preparada pra mais uma despedida. O medo tomou conta de mim e por esse motivo, eu fugi. Te evitei. Não te amei. Porque o medo maior era de não conseguir deixar de amar mais.

Confesso que foi muito difícil não te encontrar. Doído a vida inteira. Mas eu realmente acho que o melhor é a gente não viver mais esse amor-de-metades, que tem hora pra começar e acabar. Que fere. Machuca. Deixa saudades, não de um jeito bom. É que por te amar demais, prefiro não mais te ver.

Glau Ribeiro
Enviado por Glau Ribeiro em 08/12/2009
Código do texto: T1966624
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