O Silêncio e o Tempo.
Ainda me lembro, com clareza do nosso último encontro. Foi em Goiânia, na casa de sua irmã, dia das mães. Eu, como sempre solitário no meu quarto,quando bateram à porta : Era o proprietário da casa onde morava e dispunha do telefone com um recado - ela telefonou, disse para você ir almoçar, está te esperando.
Troquei-me rapidamente, e meia hora depois, lá estava eu, ao portão daquela casa, ansioso , mas feliz. Encontrei-a como sempre leve e descontraída. Brincou muito comigo, e, em determinado momento ficamos a sós..., e,hoje me arrependo porque não roubei dela aquele beijo gostoso e molhado... Seus olhos verdes, brilhavam com aquele brilho cuja intensidade somente eu, podia perceber. Finalmente, disse algo que não mais esquecerei : Eu não tenho pena de você ! Acho que, foi a maneira que ela encontrou ali, naquele momento, de confessar a impossibilidade de realizarmos nosso amor, e também uma afirmação de seu sentimento por mim... Ouvi essa frase e fiz silêncio. Nada respondi. Depois, deu-me uma carona até onde moro, e desde então não mais a vi... Surrealista ou não, o tempo passou.
Passaram-se dez luas, um bom tempo para esquecer... Mas, eu não a esqueci, acho até que ela também não me esqueceu. Como poderia ?
Hoje, eu sou alguém do tipo realista. Aprendi que não se pode sonhar sempre. E, quando sonho, absorvo as lembranças de um passado que jaz insepulto. São apenas imagens misturadas no meu inconsciente, transfiguradas, ambíguas e, que tentam falar algo. Hoje, conhecendo a realidade, me coloco diante de um mundo contraditório, onde não existe lugar para a esperança, (porque o preço da esperança, é a dor). Está certo, me transformei num asceta da realidade, onde não me é permitido viajar pelo tempo, e navegar. Mas, navegar é preciso... Acho, que quem espera, nunca alcança. Após, tudo que aconteceu entre nós, essa minha fuga aqui pra Brasília, acabei ficando na saudade. Fiquei sim, fora de foco de uma câmera esquecida, filme velado no interior do meu coração. Agora, são momentos de lucidez e reflexão sem o fogo ardente daquela paixão, e com a serenidade de quem ama, como algo sedimentado, lavas resfriadas de um vulcão. E, o que vejo ? Vejo enormes faixas negras de quartzo fundidas no granito brilhante, desenhos lindos mas desconcertantes...
Meu coração explodiu. Depois, como um vulcão supostamente extinto, adormeceu. Apenas deixando subir um filete de fumaça branca. Porém, ele não está extinto, algum dia , quem sabe, irá acordar e rugir feito um leão. Ele não se extinguirá nunca. Mas, uma coisa me parece uma verdade: Este intenso querer, sutil sentimento revelado, que outrora fora encoberto pelo fogo devastador daquela paixão. É por isso que eu chamo este sentimento de amor. Fundido no meu próprio ser, tenho que conviver com ele, tenho que compartilhar minhas emoções provavelmente com ninguém... Isso, pode ser um castigo dos deuses, ter que viver um paradoxo: Um amor que me torna feliz, na esperança renovada a cada encontro, a cada beijo, a cada momento de amor e, infeliz ao mesmo tempo, na clareza da realidade, porque, não se realiza nunca !
Certamente, ele irá sobreviver, alheio a indiferença e a dúvida, como um tolo a vagar pelas montanhas, tocando sua flauta e, desafiando as madrugadas. Também sei, que onde e com quem estivermos, não importa, ele estará entre nós, como um fantasma. Sempre haverá o confronto, este medo, a distancia, esta irmã do tempo, e o silêncio, este salteador das madrugadas insones, das noites quentes e intermináveis, cúmplice da angústia, companheiro inseparável nas mesas dos bares.
Eles formaram um conjunto, uma forma malsã de manifestações contrárias a nossa felicidade. Juntos, abriram uma fratura quilométrica entre nós, e deixaram-me a palidez de uma saudade que algumas vezes aperta o coração, e um tédio prolongado. Então, seguem conspirando e servindo-se de nossos desejos frustrados, sem contudo, nos separar definitivamente. Não obstante, esta tarde fria que desceu em nossas vidas, o apelo quase desesperado de renúncia, ainda que promovam a incerteza e o desencontro ou que somente digam adeus, estou seguro que jamais poderão excomungar nosso amor, por mais que tentem, não conseguirão realizar o divórcio de nossos corações, porque conjuramos nossas almas e nos tornamos inesquecíveis...
Essa, pode ser minha vingança. Esse, poderá ser o prêmio dos deuses.
Álvaro Francisco Frazão