NA SOBREVIDA

E ter desistido antes de começar

e ter projetado seus dias

para um futuro logo ali

(já nem verei tais acontecimentos)

engolindo os dias no atropelo

de quem cumpre obrigação e tem pressa

nem gozo, nem sabor, nem efusão

no arrastar das cargas impostas

e aceitas como fato consumado

engolindo o café e correndo

a cumprir e cumprir

engolindo sem mastigar, goela abaixo

cara de espanto, cabeça rodando

corpo pedindo, gritando e tu só indo

e deixando a vida pra depois

que ainda há tempo, que ainda há...

(que tempo, que engano de estar vivo)

cabeça rodando, vontade enfrascada

mais uma noite amanhece e tu

e eu, varando as madrugadas

vontade enfrascada desejando

possibilidades, em lugar de sonhos?

fatos, em lugar de suposições?

mas parece que tememos tal intensidade

e além disso a vida mal chega à próxima esquina

quando a morte já está ao volante

motorista em "direção ofensiva"

ah, é duro viver sob a sua clava

ouvir seu riso de dentes falsos

zombando de nossas aflições

viver este fim de tarde vendo o sol

descer implacável, para o derradeiro horizonte.

E ter desistido antes de começar

e ter projetados seus dias

para um futuro logo ali

que depois quem sabe, depois...

É ter morrido dia após dia

a cumprir, a cumprir,

engolindo sem mastigar...

Mas... estranho mistério da natureza inconformada

infiltram-se na escuridão uns versos temerosos:

Estando então, ao deus dará desta jornada

ainda assim, teimosa sina, o corpo grita

pede socorro, gesticula, agita

e ainda espera o seu amor na madrugada...

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 29/10/2009
Código do texto: T1893548
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