REALIDADE RECRIADA

Essas palavras que “soltamos”, auto-reflexionistas, por si mesmas vão questionando um realismo subentendido sobre a realidade literária. Esta passa a existir ao ser contada e, ao ser contada é destruída (no sentido de reconstrução) ou transformada.

A partir do vazio que a primeira linha carrega, o problema se constrói. Constrói?

O essencial, para mim, sempre será desconhecido até a última linha ou, até mesmo, a última palavra, porque nenhuma idéia de mundo é completa ou absoluta. Em cada leitura e releitura o sentido se transmuta em acréscimos, supressões e antagonismos interpretativos. Recorremos à realidade a fim de encontrar outra mais profunda que reside na captação do mundo, a partir do olhar individual sobre esse mundo. Mesmo que a realidade não “fale”, há uma criação de paralelos entre o real e o irreal, desdobrada em outra(s) voz(es) pelo prosador. Até que ponto uma obra pode ser tida como confessional? Até que ponto um obra pode ser classificada como ficção? Há uma pitada de realidade em toda ficção e vice-versa, de forma que, como diria Mario Bellatin, realidade e ficção não se separam. Vamos todos então ”soltando” nossas realidades recriadas.