10072009

dezenove anos e bebia como uma velha viúva. uma, duas, seis caipirinhas. FORTE, ela dizia, tentando manter a voz firme a cada nova rodada. não devia ter saído de casa. precisava esquecer primeiro. na sétima dose, já balançando involuntariamente as pernas, resolveu que ia dançar. era a Augusta, bastava sair do boteco onde estava e atravessar a rua, pronto.

tu tá meio Amy, hein, amiga?, alguém lhe disse na fila. ignorou. a pista agora era só sua. um cigarro. outro. tequila. bebia para esquecer dele e acabou por esquecer-se de si mesma. sem que notasse, lá estava, ao telefone. voz doce, ele disse. voz bêbada, ela pensou. mas seguiu. queria que ele estivesse lá de qualquer jeito, mesmo sem entender o porquê. em nenhum lugar você vai encontrar alguém te esperando como eu estou aqui, disse, já sem noção alguma.

e ele veio, mesmo que com medo. sua banda favorita, cervejas, ervas e paqueras frustradas. two stoned young folks rumo ao apartamento 123, na vila mariana, madrugada chuvosa de julho. cansados, bêbados, alucinados. cama, tesão, roupa sai, membro entra. o sexo intocado dela de repente possuído por alguém. ele forte e com vontade, ela sentindo-se rasgar ao meio, feliz e triste, bêbada. o gozo, o sono, os dois abraçados, nus, janela aberta, o vento frio. ela acordada a contemplar a calma face dele, que dormia profundamente. ela o amava. ele só não queria vê-la sofrer e se dividia sua cama agora, era um pouco por pena – o outro pouco também.

levou-a para o metrô às seis da manhã como quem se livrava de um fardo. chovia. a sensação de estar sendo rasgada ao meio (ela só notou agora que estava sozinha) ia muito além do sexo. virgindade maldita, foi embora tarde, pensava. e com alguém que amo muito, completava para si. valeu a pena. mas agora tudo doía. não o físico, doía tudo por dentro, toda mínima lembrança, todo seu sentimento.

seria burrice insistir, e ela sabia. só precisava respirar e se recompor. precisava esquecer e encontrar um homem de verdade. alguém que a amasse, porque pena não a levaria a lugar algum. desceu a rampa na chuva, com sua meia calça preta rasgada, delineador escorrendo pelo rosto, vestido vermelho encharcado colado ao corpo. déja vu. eu tô exatamente aonde eu queria estar, pensou. sentiu que a história tinha acabado. sabia o rumo de tudo dali pra frente. e estava certa em todas as suposições: ele nunca mais ligou.

Nica
Enviado por Nica em 24/10/2009
Código do texto: T1884583
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