Epifanía d’alvorada
Agora me lembro, às 4:45...
A respiração suave, a música rompe o silêncio dos meus pensamentos... Tomo um gole de café, olho ao redor, vejo somente sombras espalhadas por minha casa sem lâmpadas, uma tela brilhante diante dos meus olhos rápidos quebra a harmonia escura... Outro gole de café e como num transe, sinto os pensamentos se concatenarem como há anos atrás não os vira... Lentamente, o dia rompe as amarras da noite... a escuridão vai libertando a luz como se terminasse sua gestação tão preciosa. A música acompanha... em momentos frenética, noutros, suave... Toco pela terceira vez a xícara e percebo: depois de tudo, meu toque ainda sugere leveza... Mas meu espírito, agora, tem corpo.
Os urros da música acordam o que sou. Despertando-me ao ritmo do nascer do dia... Sem qualquer peso ou temor. Os objetos lentamente conquistam forma e cor. "Não preciso de crenças, fé ou dúvidas." O que havia para ser enterrado o foi em seu devido funeral. Todo réquiem tem endereço e momento certo. Lembro do cadáver de meu pai, um funeral bem simples. A frase me salta arrebatando o resto de leviandade: “Nunca chorarei os mortos.”
Uma breve pausa na música, faixa 3 ou 4, uma voz suave... um arrepio corta minha espinha e se estende por todo corpo. Quase posso sentir o cheiro Dela... Uma cor vermelho sangue explode do sol, derramando-se pela janela. Os encantos negros não me alcançam mais e só a luz me serve de deleite. O equilíbrio se estabelece. Volto a ser EU.
Já está paga a devida dívida pelos excessos infantis de minhas escolhas.
Levanto da cadeira em movimento livre, vou indo tomar um banho...