CLARIDADE
Passos vestidos de noite. No caminho, neblina. Uma cortina de estrelas guarda os vestígios de sonhos que molham o chão de realidades. Sonolentas pegadas rumam indiferentes à vista embaçada... São engrenagens do ir-e-vir, acostumadas ao automatismo dos horários e obrigações.
Entreato. Aos poucos a névoa se dissipa e o céu surge perfeito. Delicadamente cerzido nos horizontes de arranha-céus. Um infinito prateado que não se limita aos tons azulados e anuncia um sol ainda tímido. Reflexo de um todo, quase espelho, argenta meu corpo com a reprodução da beleza descortinada. Firmamento dá luz às sombras preguiçosas que se espreguiçam e me alcançam com a ternura de uma rósea aurora e acendem o vermelho fogo dos anseios mais íntimos no zênite de uma percepção.
Longe, os rios correm e desenham o sorriso profundo na terra, os pássaros cantam com a percussão de um farfalhar de asas, a procissão de formigas consagra o alimento numa sucessão de dias, a flor debuta com o desfolhar de um botão... A vida desperta para um mundo presente que tantos dias deixei de redescobrir encasulada num olhar cansado. Renascem os sonhos sagrados na comunhão com a natureza divina da existência.