REFLEXÃO
Quando tudo parecia perdido
Como num labirinto concedido só aos existencialistas
Vi, lá ao fundo, a possibilidade da retomada.
E possuído da crença encontrada só nos esperançosos
Crenços que cada dia trás outro e novas luzes
Não desistia da certeza que não existe verdade absoluta.
Quando tudo parecia morto
E o fim às caras turvava chances de um novo de vir
Nada dizia e calava-me em pensamentos íntimos e não compartilhados
E no meio da multidão atarefada e comprometida com o sustento parco
Um choro renascendo dispunha novas alegrias.
Quando tudo parecia opaco
E o embaçado do vidro do carro
Ofuscava o que à frente se veria à luz do dia
Nada se pode e nada se negou o que não se pediu
E a janela aberta após noite tempestuosa
O brilho do Sol aqueceu o dia que se esperava nublado.
Quando tudo parecia sem sentido
Li, num livro já esquecido no armário, meu poema favorito
Quando tudo parecia.....
Não pude, ainda que tentasse esquecer, virar os olhos
E, ainda que não tentasse, também não conseguiria lembrar
O quadro pintado não aceitava retoques
E a galeria da vida que não cobra ingresso e está a olhos vistos
Exibia os outros em que me reconheço.
E eu, negando-me frente ao espelho, era só imagem refletida
Via no outro “eu” aquilo que gostaria de ter sido
E o sucesso tão propagado e enaltecido
Não considera aquele que chega em segundo lugar
E infelizes se tornam os que se guiam pelos projetos alheios.
Quando tudo parecia esquecido....
Quando parecia querer ser lembrado
Quando tudo parecia parado no tempo
Nada pude, nada quis, nada desejei e nada tentei
Somente me permiti contemplar o horizonte
E Kafka surge pelas paredes e sinto vergonha.
E o espelho me olha fixamente
Calado e imóvel fico e sem o que dizer
Recorro ao papel e registro desconexas palavras
Entregues ao veredicto dos que delas serão cúmplices.