Não era só meu o poema que se perdeu quando tocou a campainha.... rompendo o silêncio sempre há gritos e mediocridades e clamores de uma vidinha tão singular e sem sal. E a gente perde o que não se quis, a gente não quer e perde, deixa passar, enquanto passamos. Estamos sempre passando e, passados, passamos sem ver o crepúsculo, ou aquele por-do-sol. A gente não vê nada no espelho.
Não era só meu o sonho que se perdeu... esquecemos dele sempre que se abre e fecha rapidamente a porta do trem. Quando respondemos o "bom dia" protocolar de sempre, sempre o mesmo, sempre igual. E esvaziamos todas as horas do dia enchendo a agenda. Deixamos a noite passar sem um suspiro, sem nem sequer um arrepio de perplexidade diante do tão comum e corriqueiro de uma vida besta e sem sonhos, sem aspirações, sem ter aonde ir, o que fazer e sem ter a menor ideia do que há por sentir. E descobrir...
Não era só meu o amor que se perdeu... ah, nossas emoções tão bem planejadas, nossas mais doces ilusões estampadas em out doors fora de nós, fora e tão distantes, nossos sentimentos self service, nosso prazer delivery, nossas lágrimas plastificadas para viagem. Nosso tesão fast-food, tanta assepsia em nossas relações mais banais, a distância mais conveniente, nossa posição tão segura bem aqui dentro... nossos amores fabricados em série na linha de montagem dentro do peito.
Não era só minha a imensa tristeza quando olhei o álbum de fotos da vida.... e vi como era lindo aquele amor tão fora de moda, ultrapassado, embolorado, esmaecido, amarelecido com o pó do tempo. Aquele romantismo tão imbecil e que sempre tinha sido tão bom, tão bom que chegava a ser ótimo.
Não era só meu aquele amor que se perdeu pelos fios dos postes em inúteis interligações telefônicas, que se dissolveu e se banalizou via cabo.
Não era só meu, e nem sei se tinha sido um dia meu, amor ridículo e impossível, impraticável, amor inimaginável. Empoeirado numa sala de museu aquele amor, ah, amor, vi também que ele era teu.
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 25/09/2009
Reeditado em 22/09/2021
Código do texto: T1830109
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.